domingo, 21 de novembro de 2021

A PRIMEIRA IMPRESSÃO É A QUE FICA


     Vou te fazer uma pergunta e gostaria que fosse sincero. O que você acha: a primeira impressão é mesmo a que fica?

     Diversos estudos sobre essa questão já foram publicados e ao que parece, sim, tendemos mesmo a formar um conceito, uma opinião sobre alguém – e pasme – em poucos segundos, após o primeiro contato. Uma série de circuitos neuronais são acionados quando conhecemos uma pessoa, inclusive inconscientemente* (*quero que guarde bem essa palavra) e, em menos de um minuto, somos capazes de nos dizer se essa pessoa nos causou uma boa impressão ou não. Mas será que isso é o suficiente para formarmos uma opinião sobre determinada pessoa?

     Como várias pesquisas de fato já demonstraram que essa resposta é sim, a primeira impressão é a que fica, não vou me ater a isso. Pelo contrário, vou problematizar um pouco mais. O importante não é se a primeira impressão é a que fica, a questão é a seguinte. O quanto essa impressão está correta? Sem viés? Ou pior: sem alguma projeção?!

     Lembra quando pedi que guardasse aquela palavra? Pois então. Vamos recapitular rapidamente aqui. A projeção é um mecanismo de defesa inconsciente em que enxergamos em outra pessoa características – quase sempre negativas – que são nossas. Por termos certa incapacidade de enxerga-las em nós, seja por não conseguir lidar ou por não aceitá-las, ocorre o mecanismo de projeção dessas nossas características na outra pessoa. Resumindo, aquilo que não conseguimos – ou que não podemos – enxergar em nós, enxergaremos no outro. E não raro nós combateremos isso na outra pessoa através de críticas e julgamentos. Quando não, apenas lançaremos mão daquele famoso “não fui com a cara de fulano”. Mas até que ponto não estaríamos nos enxergando nessa pessoa?

     Vamos refletir um pouco. Se acabamos de conhecer uma determinada pessoa. Nunca nos vimos antes. Com base em quê, nós poderíamos concluir – com exatidão! – que a impressão que tivemos a seu respeito estaria correta? Veja que não estou afirmando que as pesquisas estejam erradas, pois acredito que tendemos mesmo a formular respostas como essas rapidamente. E inconscientemente também. Apenas acho oportuno analisarmos as nossas conclusões sobre essas impressões, principalmente com processos inconscientes sabidamente em ação.

     Um outro ponto importante são os vieses cognitivos. Vamos imaginar que você tenha uma determinada religião que use uma vestimenta característica e a pessoa que acaba de conhecer seja também desta religião. Ou que essa pessoa venha trajando a camisa do time de futebol que você é apaixonado desde criancinha. Ou da sua banda de rock favorita. A chance de você gostar dessa pessoa que acaba de conhecer é grande. E se fosse o contrário. Se a pessoa usasse a camisa do time de futebol que venceu o seu time no último campeonato? Ou fosse daquele partido que você detesta, porque sabe que tem políticos corruptos? Percebe que nesses casos existem fatores que contribuem fortemente para a sua primeira impressão? Isso são vieses cognitivos.

     Não estou dizendo que a primeira impressão não é a que fica. Estou apenas propondo uma re-fle-xão dessa impressão. Aquela pessoa que desde o começo você não foi com a cara dela, será que ela tem características de personalidade ou algum comportamento que você ainda não percebeu em si mesmo? Se você quiser ou se achar que deve, eu proponho a você um simples exercício. Procure uma pessoa neutra que te conheça bem, que você sabe que será sincera com você e pergunte a ela se por um acaso você teria alguma das características que você odeia na outra pessoa. Eu não sou vidente, mas já adianto que você poderá se surpreender com essa resposta.

     Agora vou problematizar ainda mais trazendo um outro ângulo dessa questão, para pensarmos juntos. Lembra que toda essa nossa discussão está girando em torno da palavra: “inconsciente”. um outro processo que também é da ordem do inconsciente e que não se trata de um mecanismo de defesa. A intuição! Segundo Carl Gustav Jung, a intuição é uma função psíquica que está intimamente atrelada a processos inconscientes. Quando você tem de repente uma percepção, uma resposta afirmativa ou negativa à determinada circunstância e você não sabe explicar a origem e o porquê disso, provavelmente essa sinalização veio do inconsciente à consciência. Esse conteúdo estava armazenado no seu inconsciente e não sendo reconhecível até esse momento. E não tem nada de misticismo.

     Isso significa que você pode, justificadamente, não ter uma boa impressão de uma determinada pessoa que acaba de conhecer. Você intuitivamente foi capaz de perceber algo nessa pessoa que seria negativo a você. Você não entende o porquê, mas intuitivamente sabe que não é bom manter contato com essa pessoa. E olha, na grande maioria das vezes a sua intuição pode estar correta! Agora você deve estar se perguntando exatamente o seguinte.

"Como saber quando estou usando algum viés cognitivo, projetando conteúdo ou intuindo algo?!"

     Ah! Se fosse fácil assim, eu jogava na Mega-Sena! Eu não sou vidente. Mas brincadeiras a parte, não é fácil mesmo. O ser humano é um bicho complexo. Multifacetado. E desconhecemos a nós mesmos também, o que não ajuda muito. A orientação que posso te dar nesse sentido é a mesma que sempre me dou. Nunca tomar nada como muito certo. E isso vale tanto para gostar demais de uma pessoa, quanto a não gostar de alguém. Todas as vezes em que tenho uma impressão muito forte de uma determinada pessoa, procuro investigar as razões da intensidade desse meu afeto. Por que eu gosto tanto dessa pessoa? Ou o contrário. Por que o jeito dessa pessoa me incomoda tanto? Procuro estar em constante análise de mim mesmo – inclusive com um profissional também. Para me familiarizar, integrar e elaborar todas as partes da minha personalidade. Mesmo as mais desagradáveis. Mas sou humano, estou sujeito a processos de projeção como qualquer pessoa. E tenho os meus vieses cognitivos também. Mas aquele exercício que recomendei de procurar um observador externo neutro é bastante interessante. E sempre faço isso. Muitas vezes essa pessoa vê em mim aquilo que alego estar vendo no outro. Ou seja, eu estou de fato projetando conteúdo meu. Procuro então analisar por que não posso aceitar esse conteúdo em mim e que está me fazendo jogá-lo para fora.

     Agora, quando essa pessoa neutra que peço ajuda me diz que não vê nada em mim, então talvez a minha intuição esteja agindo de fato. Nesse caso fico alerta. Procuro me sintonizar ainda mais com essa intuição. E não tem nada de místico ou de paranormal. A intuição vem de processos inconscientes. Só procuro prestar ainda mais atenção a isso. E não costuma demorar também até que eu compreenda as razões de eu ter tido determinada primeira impressão. A minha intuição é muito boa. E ela já me ajudou muito na vida.

     Então recomendo a você o seguinte. Tenha consciência dos seus vieses cognitivos. Procure sempre refletir as suas impressões e tome sempre conclusões pautadas na razão. Tenha consciência dos seus mecanismos de defesa. Investigue sempre – em si mesmo – as razões de determinada pessoa te provocar fortes afetos. A intuição é uma resposta instintiva, do inconsciente, com o objetivo de ajudar. Se ela apareceu tem um motivo. Tente descobri-lo.

E aí, chegamos a conclusão que a primeira impressão é realmente a que fica. Mas ela está correta?! Pense.

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