“Às vezes um charuto é apenas charuto.” Sigmund Freud
Calma, em psicanálise, especificamente a lacaniana, falo não é exatamente uma parte do corpo humano, é um significante, um símbolo, cuja função imaginária se relaciona às nossas faltas existências. Já deu pra perceber que o texto de hoje é talvez polêmico, talvez reflexivo, talvez instrutivo, talvez provocativo, o que cabe a mim de antemão responder é sim, talvez seja tudo isso e muito mais até, e cada pessoa quem escolhe como será. Se for possível a você, só peço disposição para lê-lo até o fim e alguma abertura para tentar compreender meu ponto de vista – que nada mais é do que a vista de um ponto.
Como já imaginava ocorrer em algum momento da minha vida, e cheguei a escrever sobre isso aqui, esse ano iniciei a graduação do curso de psicologia. Estou fascinado pelos conhecimentos adquiridos na sala de aula, estudar a subjetividade humana através de disciplinas às vezes aparentemente tão distintas entre si tem sido algo extraordinário, me percebo mergulhado num universo que a cada dia me interessa mais. Os conhecimentos me instigam, me provocam, por vezes me consomem por completo. Acredito que todo conhecimento transforma o ser humano, vejo isso como algo natural, vi isso acontecendo em minha primeira formação e percebo novamente agora, com a diferença de que hoje me sinto mais preparado, maduro, ou pelo menos mais em paz.
Deve estar se perguntando em que ponto entra a psicanálise hoje que estudo psicologia e a resposta é que continuo estudando simultaneamente. Tendo a oportunidade de perceber agora como a finalidade de ambas não é assim tão distinta, apenas o raciocínio e talvez a linguagem sejam diferentes; é como resolver um mesmo problema matemático de mais de uma forma, concluindo a mesma resposta. Dentro da própria psicologia tenho dificuldade para enxergar diferenças significativas entre as abordagens teóricas, a mim todas tratam dos mesmos fenômenos psicológicos e chegam a resultados parecidos usando meios diferentes para explicá-los ou tratá-los. Sei que concluirei o curso de psicologia na abordagem psicanalítica já que é a que mais conversa comigo, mas confesso que não vejo qualquer invalidação em nenhuma das outras teorias psicológicas, todas são fantásticas e podem auxiliar qualquer pessoa que precisar e se identificar com a abordagem.
Aqui entro oficialmente ao tema do texto de hoje que é o seguinte. Onde houver pessoas haverá embates, busca de poder, competição. Vejo isso já na sala de aula. Queria pensar diferente, mas confesso que hoje não consigo e acredito que o curso de psicologia me faz enxergar isso. Certa vez a professora nos disse “Psicologia é política” e ela está certa, como acho que tudo na vida; viver é um ato político. E antes que venha com qualquer discurso de senso comum acusatório, tipo “isso é pensamento comunista”, “É de esquerda...”, calma, peço que baixa a guarda e me responda. O que é ser de esquerda?! E de direita?!
Hoje em dia essas posições podem ser tão porosas e múltiplas que resvala facilmente ao engano. Quando a professora nos disse isso, ela não fez qualquer menção partidária em sua fala, ela apenas trouxe a reflexão que vivenciamos política em tudo que nos cerca, das mais variadas formas e precisamos no mínimo estar conscientes disso, seja você de direta, seja você de esquerda, de centro, seja lá o que essas posições significarem de fato hoje em dia. E antes que isso aqui vire um fla-flu, o texto de hoje não é sobre isso, vai muito além disso. Afirmo a vida como um jogo de forças quer gostemos, esperemos ou concordemos. Vida é duelo, vida é embate, vida é caos. Quisera alguns que fôssemos sempre equilibrados, que a vida fosse harmônica e as relações humanas equânimes, mas nada disso é verdade. O ser humano é caótico, contraditório, complexo e impera jogos de poder em nossas relações, porque a maior parte do tempo somos mais mesquinhos e restritos do que sonhamos. Competimos entre colegas de classe por abordagens teóricas, entre irmãos e primos por sucesso, entre colegas de trabalho por espaço, entre amigos por interesses comuns. E isso nos faz menos?! Não, isso nos faz humanos... Esse é o jogo e viver é se implicar nele.
Particularmente não sou tão fã do capitalismo, embora não temos algo melhor do que isso. Ele se encaixou perfeitamente e se alimenta de uma falta estrutural que possuímos por sermos neuróticos por natureza, essencialmente faltantes, temos um buraco que caberia o mundo inteiro. Sempre insatisfeitos, estamos em busca do próximo bem, do próximo amor, disso que certamente nos preencherá. E nunca vai... Isso parece pessimista, mas é exatamente isso o que nos movimenta. Sem falta não há desejo, sem desejo não há movimento, ausência de movimento é a morte. Então qual seria a saída desse jogo perigoso?! Consciência. Disposição para pagar o preço que custa jogar esse jogo. Não interessa se quer viver num castelo numa vida em busca de títulos e bens materiais, tampouco se vai viver de forma espiritualizada no alto de uma montanha ignorando o corpo e toda materialidade da existência, apenas saiba o quanto está consciente e preparado para os riscos e as consequências das suas escolhas, porque no fim é só isso o que importa.
Num extremo, quando estiver num casamento falido, cercado de bens materiais e se sentindo vazio porque isso tudo não te preencheu, você suportará isso se pelo menos teve consciência de suas decisões e aceitou pagar esse preço. Assim como num outro extremo se terminar sozinho nas ruas sem eira nem beira, sentindo-se livre e espiritualizado e passando fome, também dará conta se teve consciência de suas escolhas e aceitou pagar esse preço. Você pode viver seguindo apenas sua vontade, afirmando seu desejo, batendo o falo na mesa. Ou ceder seu espaço ao outro, negando seu desejo, omitindo seu falo, dará no mesmo. Quem avança sozinho desconsiderando o outro paga um preço e quem recua deixando de avançar desconsiderando seu desejo pagará outro. O primeiro passa por cima dos outros, o segundo de si mesmo. Um caminho saudável me parece o do meio, mas ele envolve negociação, envolve embate, passará pelo jogo do poder, que é a política. Não existe certo, nem errado, e cada um paga o preço que pode, ou acha que deve. Mas uma coisa é certa, a pior coisa disso tudo é não ter consciência de tudo isso.
“A felicidade é um problema individual. Aqui, nenhum conselho é válido. Cada um deve procurar, por si, tornar-se feliz.” Sigmund Freud
2 comentários:
Muito bom, parabéns, Denise Bergamo Unimax.
Olá, Denise!
Agradeço a visita, obrigado pelo comentário.
Um abraço
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