Estamos
vivendo um tempo particularmente muito diferente do que já vivemos. Eu vou partir
deste princípio para defender meu ponto de vista. Posso concordar que
serei radical em algumas colocações, mas convido você a debater
comigo este meu ponto de vista e constatar que a afirmação seguinte
faz bastante sentido. Hoje nós perdemos a noção de futuro, e nós
não sabemos o que fazer!
Mais
do que qualquer outra época, o futuro tem se diluído
gradativamente. Sim, falo com a propriedade de alguém de 27
anos, que apesar da pouca idade vê diferenças muito
significativas nas últimas décadas. Algumas delas então.
Quando criança, por volta dos meus sete anos de idade, me lembro que
era bastante comum os adultos ao meu redor me perguntarem qual era o
meu plano de vida, qual era o meu projeto para o futuro. Observava
nos mais velhos, tanto de minha família como da vizinhança onde
morava, uma motivação a criar uma carreira profissional; observava
que eles construíam suas vidas muitas vezes trabalhando para uma
única empresa até. Na escola, nós tínhamos uma preocupação
grande em estudar, em adquirir conhecimentos que nos garantissem uma
melhor condição de vida no futuro; eu me lembro que estudar era
muito importante na construção de um futuro melhor. Os
relacionamentos também eram mais duradouros, mais sólidos, assim
como me pareciam mais importantes, as pessoas se esforçavam mais
para manter laços de amizade, de namoro, de casamento.
E
por que isso tudo foi importante? Do meu ponto de vista acredito que
isso sempre será importante para a manutenção dessa sociedade que
criamos. Uma sociedade baseada – ainda – por instituições
verticais, com poderes centralizados, centralizadores, que só faz
sentido enquanto temos uma noção de futuro, enquanto temos a crença
da existência de um amanhã. Enquanto acreditamos que no futuro as
coisas serão (ou poderão) ser melhores, justificamos qualquer
investimento nosso de energia e tempo. “Vou estudar muito
hoje, para obter um trabalho melhor amanhã”. “Vou dedicar
minha energia e meu tempo extra neste trabalho, para construir uma
carreira nesta empresa”. “Vou sacrificar desejos e
vontades efêmeras, para realizar um propósito futuro”.
“Para se construir uma vida
leva-se tempo, então para gerir bem um país também”. A nossa sociedade, da forma como ela foi
estruturada, precisa então da crença de um futuro, precisa que as
pessoas invistam sua energia e seu tempo no presente objetivamente,
concentradamente, em alvos únicos para que ela possa se manter.
O
problema é que a situação mudou radicalmente. E tem mudado
rapidamente. A realidade hoje é tão assustadora, tão precária e
necessita de medidas tão urgentes que temos uma sensação de morte
eminente. Hoje nós não pensamos no futuro porque em primeiro lugar
nós o tememos! O cenário atual não nos garante no futuro nem
sequer a vida, quiçá uma condição melhor. Pedir a um jovem
que sacrifique seu presente para construir o seu futuro é motivo de
piada. Que futuro? Aquecimento global; catástrofes naturais; escassez; roubos
de dinheiro público, trapaças políticas; inflação, instabilidade econômica, desemprego crescente; aumento de
criminalidade, de violência, de mortes? Não... o futuro dele é
incerto. É inexistente. Assim como o seu e o meu. Na idade média,
o homem abriu mão do seu presente em nome do Paraíso. Na
modernidade, o homem abriu mão do seu presente em nome da
Tecnologia, de um Futuro melhor. Hoje nós não abrimos mão de nada!
Penso que se Nietzsche nos visse hoje repensaria alguns conceitos de sua filosofia.
Ele veria que o niilismo talvez tenha sido modificado; pela primeira
vez na história o homem não abre mão do seu presente em nome de
nada. Hoje ele vive a vida, desejando curtir e gozar cada instante. Impulsivamente. Despreocupadamente. Unicamente...
Se nem
tanto ao céu, nem tanto à terra. Acredito que esse nosso temor,
essa nossa descrença no futuro, é o que nos tem feito viver
“melhor” (bem entre aspas) o presente. Hoje pelo menos estamos
mais interessados na máxima “carpe diem” do poeta
Horácio, “aproveite o dia”. É o que queremos agora.
Ninguém quer se sacrificar mais em nome de nada. Vemos evasão na escola. Rotatividade de pessoal nas empresas. Descrença no poder público. Mas lembra que eu disse
logo acima que ainda vivemos numa sociedade com instituições
verticais e centralizadoras que necessitam de uma noção de futuro
para se manterem? Eis aí o nosso problema. E ninguém está sabendo o que
fazer. O Estado, o setor privado, a escola, a família,
a igreja, todas as intuições estão falindo - nos moldes antigos. Então como gerir uma sociedade que foi estruturada através da crença de
um amanhã, quando a realidade atual tem nos tomado essa crença?
Eu
só vejo dois caminhos. Ou as instituições reconstroem a noção de
futuro no consciente coletivo, fazendo com que as pessoas acreditem
novamente no amanhã e assim – quem sabe – voltem a investir energia e tempo para o futuro. Alternativa essa que acho impossível de
acontecer. Ou as instituições se transformem completamente a partir de suas estruturas, horizontalizando-se. E
quando digo isso é alterar radicalmente mesmo a forma como educamos,
como trabalhamos, como nos relacionamos, como exercemos nossa fé.
Abrindo a novos formatos, mais flexíveis, mais humanos, mais informais, menos
programados e mais momentâneos e circunstanciais. Derrubando conceitos embutidos como projeto de vida, plano de carreira, planejamentos a longo prazo. Para isso todas as instituições precisarão rever seus paradigmas
sem preconceito, sem julgamento, com maior aceitação à
diferença, à pluralidade, à diversidade. Se não derrubarmos e
reconstruirmos o nosso sistema de sociedade agora, será muito difícil
determinadas instituições sobreviverem amanhã!
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