domingo, 18 de agosto de 2013

Cisões


*Escolhi essa imagem, porque pra mim não há cisão mais natural e certa do que a aurora e o crepúsculo, que findam dia e noite, e isso não atrapalha em nada a simetria do que acontece nos intervalos.


Feche algumas portas. Não por orgulho ou arrogância, mas porque já não levam a lugar nenhum.” (Paulo Coelho)


Hoje resolvi dar uma limpa no meu guarda-roupa. Ou daqui a pouco não caberia mais nada lá dentro. Minha mãe passava no corredor, só assistindo. Quando se deu conta do que eu estava fazendo, perguntou segurando uma camisa nas mãos: “Vai dar embora? Você fica tão bem nela.” Eu sem dar muita atenção, soltei: “Mas não uso!”. E continuei a empreitada com ela revirando as peças que eu ia jogando sobre a cama. Fiquei pensando sobre esse diálogo... Fui obrigado a concordar que de fato a camisa era muito bonita. E nova! Quase nunca tinha sido usada. Pensava: "se é tão bonita ou especial assim pra mim, por que está aqui praticamente jogada?" A resposta veio prontamente. "Porque pra mim já não serve mais." Só por isso. As peças que eu tirei do guarda-roupa de fato não mudaram tanto – continuam quase em perfeito estado de quando as comprei –. Mas eu mudei! Pelo menos por dentro...

Olhei mentalmente para trás pensando sobre o passado e vi outras coisas que também deixei. E por “n” motivos. Foram costumes, lugares, manias, erros, pessoas, relacionamentos que já não me serviam mais. Profissionais, pessoais, familiares até. Cisões necessárias para que eu continuasse meu caminho melhor, mais leve, sem também pesar sobre outros. Posso imaginar que você que está lendo essas linhas está pensando que sou insensível pra considerar pessoas descartáveis como roupas. Tenho certeza de que os mais apressados nos julgamentos pensariam assim. Mas não! Não acho pessoas descartáveis. De maneira nenhuma. Aliás, nada é. Acho super interessante a ideia de reciclar e reaproveitar as coisas. Doar se necessário. Eu doarei as minhas roupas. Mas acredito muito mais no fluir da vida que naturalmente cisa. Não digo que as relações tenham prazo de validade, pois tenho amigos de muitos anos que ficamos tempos sem nos falarmos, mas quando nos vemos nem notamos diferença. Mas o inverso também acontece. Há pessoas bem próximas que vejo praticamente sempre e no entanto estamos milhas distantes. Ambos notamos isso. Não há troca nenhuma de contato relevante. Essas pessoas pra mim são como as roupas retiradas do guarda-roupa; via todo santo dia nele, mas nunca tirava uma do cabine. Vale a pena assim? Será que mantenho contato com essas pessoas porque gosto delas de verdade, as quero perto de mim pessoalmente falando, ou só porque me acostumei com a presença delas – que neste momento só ocupam espaço? Às vezes continuamos com certos laços apenas por comodismo, medo ou uma vontade de controle. Como às vezes continuamos sem saber bem porquê.

Se não desse essa limpa no meu guarda-roupa no mínimo chegaria um momento que não caberia mais nada e o saldo seria um monte de coisas que não uso ocupando espaço daquilo que eu poderia usar. A nossa vida se parece a um guarda-roupa. O espaço também é limitado. Primeiro porque ela em si é limitada; não somos eternos, vamos morrer um dia. Está aí a primeira cisão de que temos conhecimento. Segundo porque os anos são fracionados em meses, semanas e dias, que por sua vez em horas, minutos e segundos; como as leis, os valores, essas divisões são cisões também. Terceiro porque somos animais racionais que cisam o desejo impulsivo e desmedido para a nossa própria sobrevivência. A vida é composta por esses cortes. Vamos caminhando nos fazendo eles, podando a nós mesmos. Mas são cisões necessárias para o bom fluir. É isso o que garante a qualidade das relações. É isso o que nos ordena, nos organiza, nos potencializa. Por mais cruel que pareça. Não é insensibilidade, não sou um robô. Sou honesto. Honesto de não querer vestir aquilo que não gosto, que não cabe em mim ou no meu bolso. Honesto de não ficar forçando a barra numa relação que não dá certo e gastar a vida com momentos que no fundo não valerão a pena. Não me refiro a intolerância com personalidades distintas. Falo num nível mais profundo, mais íntimo. Falo de liberdade, de honestidade, de transparência. De podas necessárias como as que fazemos nas plantas. Para um crescimento sadio. Falo de manter laços que concordam de fato com nossos desejos e capacidade, porque muitas vezes nós nos acorrentamos a determinadas coisas por ganhos mínimos. E a vida vai embora!

Acredito sinceramente que não precisamos fazer nada, apenas deixar que a vida se encarregue de fazer o trabalho dela. Essa poda. Só precisamos emitir pensamentos de acordo com os nossos desejos, para assim atrair o que será necessário. E para isso precisamos nos conhecer direito e emitir as vibrações certas. Autoconhecimento e magnetismo. A vida faz o resto! Ela traz o que é necessário e afasta aquilo que está numa vibração diferente. Para o bem estar de todos. Repare ao seu redor que, quando você permite que o fluxo aconteça livremente, aparecem as pessoas certas, você não se encontra mais com algumas outras. Certas circunstâncias nos obrigam a rescindir com determinadas coisas para o nosso bem então, só que muitas vezes nós fazemos o inverso, segurando o fluxo. Aí sofremos. Sofremos por não aceitação do fato. O sofrimento não vem do corte em si, vem de não aceitarmos a contradição. Somos muitas vezes mesquinhos, imaturos e materialistas. E agimos com possessividade (nos) agarrando as coisas, seja a um relacionamento desgastado, seja uma peça de roupa sem uso, porque são essas coisas que nos dão a ideia de alguma “segurança”. Só que é falso.

Para finalizar, hoje à tarde, acessei uma rede social e coincidentemente percebi que um amigo publicou que curtiu o livro do Paulo Coelho, Onze Minutos. Também gostei. Ele tem uma passagem perfeita para esse post que diz: “Não se pode dizer para a primavera: 'tomara que chegue logo e dure bastante'. Pode-se apenas dizer: 'venha, me abençoe com sua esperança, e fique o máximo de tempo que puder'.”

Nós não temos domínio sobre a Vida, mas nós nos controlamos em algum nível. Tudo o que precisamos então é sermos honestos e tentarmos dançar no mesmo compasso.

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