segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

A eterna luta do bem contra o mal



Quando olho para trás para cada mês deste ano e tento fazer uma espécie de retrospectiva, é inevitável me fazer a seguinte pergunta: “Que ano foi esse?”.


Em muitos momentos ao longo do ano, tive a impressão de estar pisando em ovos ao ver as pessoas ao meu redor se agarrando a crenças e opiniões de forma muito radical. O ano inteiro, mais especialmente no segundo semestre com a proximidade das eleições, só se ouvia falar de “nós” e “eles”. E podemos classificar esses “nós” e “eles” de inúmeras formas. Esquerda e direita. Verdadeiro e falso. Certo e errado. Bem e mal. Deus e o outro. Era tanta dicotomia com polarizações e opiniões tão rasas e superficiais que em muitos momentos me perguntava se precisava tudo isso. Brigas entre familiares. Discussões entre colegas de trabalho. Entre amigos. Pessoas desfazendo laços por conta dessas diferenças, onde a maioria das discussões começavam com o gancho da política e corriam para todos os campos, fosse a religião, a sexualidade, a regionalidade, a cor etc. Isso só me provou uma coisa: nós todos precisamos trabalhar mais a nós mesmos; a nossa tolerância; aprender a enxergar o outro e a respeita-lo em toda a sua diferença. O outro não é nosso inimigo. O outro é só uma pessoa que foi criada por uma família diferente da sua, que teve outras experiências e percepções na vida e tem as suas próprias subjetividades. Talvez para alguns isso que irei escrever aqui seja difícil compreender, mas uma coisa é fato: o outro é um mundo! Cada pessoa carrega em si um mundo em toda a sua complexidade. E aí entra o gancho deste post, que ao meu ver me ensinou muito durante 2018. A gente não muda o outro! O outro se muda quando quiser, se quiser. E não deveria haver problema aceitar que ele seja assim.

Ver um homem que beija outro não deveria ser problema para ninguém, além dos dois. Ou das duas. O que duas (ou três) pessoas fazem, sexualmente falando, diz respeito a essas pessoas, e quem se intromete está se intrometendo onde não é chamado. Simples assim. Me desculpe se isso fere os seus princípios éticos/morais/religiosos. Se incomoda tanto feche os olhos, não busque ver nem saber ou se intrometer nisso. Não traga isso para a sua vida e arbitre sobre o seu corpo. O que o outro faz da sua vida, do seu próprio corpo não me interessa. Interessa a ele! Se um cidadão se declara petista porque comunga das mesmas ideias do partido ou um outro adere a ideia de ditadura não me interessa. Não é ser omisso ou demasiadamente neutro, é só aceitar que o outro é diferente, pensa e sente diferente. E está tudo bem ele ser assim. Democracia não significa todos serem iguais, muito pelo contrário, é o encontro das diferenças de forma civilizada. Legal. Respeitosa. E politicamente falando, lá nas urnas! Não é dentro de casa, do trabalho ou na vizinhança que atuo politicamente. A gente exerce nossa política no voto. E quando o voto da maioria gera um resultado que não nos agrada, precisamos ser adultos. E por isso existem mandatos.

Significa que tenho que aceitar aquilo ou aquele que segue caminhos que vão contra tudo o que acredito? Não. Ninguém é obrigado a aceitar ninguém. Apenas a respeitar! Não sou a favor nem aceitaria uma ditadura, mas respeito quem ache bom pra si ou para o país. Eu não sou a favor da legalização da maconha (com as devidas ressalvas), mas respeito quem use – e esta pessoa não deve nada a mim; seu corpo, seu dinheiro, seu tempo, ela utiliza como bem entende, isso não me interessa. Mesmo porque o fato de não ser legalizado nunca atrapalhou ninguém de acessar...

E refletindo sobre esse movimento, de acordo com a psicanálise, esse ódio que estamos presenciando tem dito muito sobre os que proferem os insultos. Não sei se você tem consciência disso, mas tudo aquilo que te incomoda demasiadamente no outro, a tal ponto que te faça ataca-lo por isso, em algum nível esse movimento está dizendo muito sobre si mesmo. Se existe um impulso de atacar o outro, de denegri-lo ou até de extingui-lo, por ele ser diferente, recomendo que entenda melhor o porquê disso. E rápido! Já que é óbvio que isso está tentando te dizer alguma coisa... O que seria eu não sei. Não estou aqui diagnosticando nada, nem julgando ninguém; mas acredito que o que o outro busca fazer com a sua própria vida não deveria nos incomodar – tanto.

Quem me acompanha neste espaço sabe que a minha maior dificuldade sempre foi aceitar as pessoas que pensam diferente de mim. Vira e mexe, eu me via metido em discussões onde ficava argumentando e rebatendo alguém, no intuito de provar a esta pessoa o quanto ela estava errada. Sabe o que eu ganhava com isso? Nada de bom. Só inimizades. Era visto como o moralista chato. Aquele que quando estava chegando numa roda de pessoas já podia ouvir: “ai, lá vem ele...”. As pessoas não gostavam da minha companhia. E vamos combinar: quem gosta de um crítico julgador moralista religioso pregando suas verdades o tempo todo? Ninguém aguenta. É cansativo. O excessivamente religioso que prega o tempo todo acaba sendo chato. Aquele que defende seu partido com unhas e dentes é cansativo. A feminista radical; o politicamente correto do meio ambiente; o extremista da direita; o extremista da esquerda; todos esses quando começam seus discursos ideológicos, de forma incessante, crítica e ácida, sem validar opiniões opostas e muitas vezes sem o menor senso do inoportuno, terminam sendo pessoas difíceis de conviver. E vivemos em sociedade meu Deus! Por essa razão já faz alguns anos que venho tentando mudar; ser menos rígido e inflexível, e passei a respeitar a verdade dos outros, porque só a eles diz respeito.

Hoje eu dou uma ideia a alguém, falo da minha ideologia, mas procuro ouvir como a pessoa pensa. Sem ataca-la. Sem julgá-la. Numa conversa normal onde o mais importante pra mim é conhecer o universo do outro. Pode ser que ele não mude com a minha visão de mundo e nem eu mude como penso, mesmo assim está valendo o encontro, pois o objetivo não é convencer; é encontrar pontos em comum e principalmente, conhecer um ao outro. Eu sou católico, mas recebo testemunhas de Jeová na minha porta. Já os ouvi diversas vezes. Tenho amigos evangélicos que me contam como vivem sua religião. Aprendo muito. Culturalmente é rico. E continuo sendo católico. A grande mensagem que quero trazer com essa postagem de fim de 2018 é que precisamos nos autoconhecer mais. Quando a gente investe em autoconhecimento, descobrimos dentro de nós mesmos contrastes e contradições, então a partir daí é mais fácil entender o outro.  Não digo para aceitar, amar ou copiar. Digo para respeitar! Legitimar, autorizar que o outro tenha o direito –  constitucional ainda no nosso país – de ser o que ele quiser. De pensar, agir politicamente e exercer o seu credo. Eu me autodeclaro como de esquerda. Está no meu Face, lá na descrição. Mas no fundo tenho plena convicção também que existem tantos matizes, mesmo dentro da(s) esquerda(s) e direta(s), que nem sei definir o que seria de fato isso hoje em dia. As vezes sinto que entre o pessoal da extrema esquerda sou julgado como de direita e entre os da extrema direita sou considerado muito progressista. No entanto, não existe uma só pessoa que poderia dizer que me viu discutindo política. Todo mundo me perguntou este ano em quem eu votaria e não respondi, nem aos meus próprios familiares. Não votei no Bolsonaro. Hoje eu falo. Mas confesso que gosto dele, também. Ele tem aquele jeitão mas sinto ser um homem honrado. Não concordo com algumas de suas ideias, mas em muitas eu concordo sim. Me parecem bem razoáveis para o nosso país. E não estou traindo a “esquerda” por isso. Como também não estou traindo Nossa Senhora de Fátima, da qual sou muito devoto, por dizer que gosto da religião evangélica onde eles não veneram santos.

No fim, somos todos cidadãos. Moramos na mesma casa – as vezes literalmente! Trabalhamos juntos. Precisamos dar produção. Se faltar algo na minha casa, é no vizinho que vou bater. Não votei no Bolsonaro, mas entendo que vivo num país democrático onde ele venceu pela maioria dos votos e que ele e eu somos brasileiros e estamos no mesmo barco, devo respeitar sua legitimidade como governante eleito. Entre direitas e esquerdas, religiões e sexualidades, somos todos humanos. Somos de carne e osso. E d’baixo da terra, após o último fechar de olhos, todos nós vamos feder do mesmo jeito. Existem pais, mães, filhos, amigos, vizinhos, colegas de trabalho envolvidos em brigas ideológicas, que me pergunto: será que vale a pena dormir estando com a razão, se para isso foi preciso brigar com todo mundo? Seja qual for a religião, a constituição, a ética e a moral, o princípio essencial é sempre o mesmo: não faça ao outro aquilo que não gostaria para si. Quando estamos juntos somos mais fortes e nossas diferenças menores.

Tenhamos todos uma boa passagem de ano e desejo a todos um bom 2019. Regido por Marte ainda!! rs


domingo, 18 de novembro de 2018

O TESTE PSICANALÍTICO DA MINHA VIDA


     Há uns dez anos fiz um teste que proponho que você o faça agora. O objetivo é apenas autoconhecimento. Na época me surpreendi com o quão interessante foi o resultado desse teste por conta das reflexões que ele me trouxe. O curioso também é que no decorrer dos anos, de tempos em tempos me pego refletindo seu resultado novamente e por incrível que pareça ainda hoje ele me é intimamente revelador. Ao longo dos anos o fiz com diversas pessoas e muitas o consideraram mais como uma brincadeira (talvez até seja mesmo), mas em todas as vezes em que ele foi aplicado não pude deixar de reparar como os envolvidos ficavam impactados e se punham a pensar sobre o resultado. Como já disse, por mais que alguns o vissem como algo... talvez bobo, percebo que ele parece revelar à pessoa algo de muito íntimo. Então eu proponho que você o faça agora e logo adiante explicarei a dinâmica desse teste e como você chegará ao seu resultado; assim como dividirei aqui o meu próprio e quais foram as principais reflexões que ele me gerou.

     Procure fazer esse teste num momento que você esteja bem consigo mesmo, calmo e relaxado. Procure um local silencioso, em que possa fazer com tempo e tranquilidade e que não seja interrompido durante esse período. Pegue um pedaço de papel e algo para você anotar. Não leia o texto todo antes de concluir o teste e tome cuidado para não ler o resultado também – isso vai te influenciar.


TESTE:
     Feche os olhos e pense em três animais, quaisquer que sejam, depois os escreva no papel, conforme os exemplos abaixo.

     Agora pense apenas no seu primeiro animal. Concentre-se apenas no primeiro. Imagine-o. Observe-o em sua mente: como é esse animal; como ele se movimenta; como ele se sente... Escreva no papel três características psicológicas (é o comportamento, é o “jeito” que o seu animal tem). Não se preocupe com as características psicológicas escolhidas pois não terá característica certa nem errada, só é importante que neste momento você seja fiel ao que está imaginando em sua mente e tente descrever exatamente o jeito do animal de acordo com a forma que ele se parece na sua visão.

ANIMAL: ______________ , ______________ , ______________ .

     Agora faça o mesmo com o segundo animal, concentrando-se apenas nele e descrevendo quais as três características psicológicas que você está percebendo pelo comportamento que ele tem.

ANIMAL: ______________ , ______________ , ______________ .

     Agora repita o mesmo com o terceiro animal, concentrando-se apenas nele e descrevendo quais as três características psicológicas que você está percebendo pelo comportamento que ele tem.

ANIMAL: ______________ , ______________ , ______________ .


RESULTADO
O primeiro animal é como você se vê.
O segundo animal é como você é visto.
O terceiro animal é como você é de fato.


     Agora explicarei a dinâmica do teste, na minha análise, com base naquilo que li na época quando fiz o teste comigo e com base naquilo que intui e observei ao longo dos anos nas diversas pessoas em que apliquei. Já advirto: se o seu resultado dá 100% certo ou se trata apenas de uma brincadeira, eu não sei, portanto não o leve a sério. Recomendo que o utilize, talvez como um ponto de partida, para uma reflexão sobre si mesmo – o que é sempre válido. E se você ficou tão surpreso quanto eu, e as diversas pessoas que o fizeram, vou colocar agora a minha análise utilizando o meu próprio resultado. E com base nas minhas percepções você vai analisando – de forma crítica – o seu próprio resultado.

     Quando fiz esse teste comigo a dez anos atrás, ficou assim:

CAVALO: LIVRE, SELVAGEM, INDOMÁVEL.

LEÃO: ARROGANTE, OBSERVADOR, ORGULHOSO.

CÃO: FIEL, LEAL, PROTETOR.

     Primeiramente, não importa a escolha dos animais em si (seja cavalo, leão, cachorro, cobra, escorpião etc.), porque nesse teste não existe um animal considerado bom ou mau, o que importa mesmo são as características percebidas e descritas de cada animal. Posso por exemplo escolher uma cobra (que é considerado um animal peçonhento) mas na minha mente percebê-la com características tidas como “positivas”. Portanto, o animal em si não é um fator tão importante, mas sim o que se percebe do mesmo. E por esse motivo talvez o teste até pudesse ser aplicado utilizando outro exemplo ao invés de pedir animais, mas a escolha de ser com animal é pelo fato de podermos colocar neles características “humanas”, de podermos projetar mais facilmente, porque no fim este é um teste projetivo. O objetivo é justamente fazer o indivíduo se projetar em algo; e ele fará isso sem perceber através dos animais.

     O primeiro animal fala justamente da forma como nos vemos, como acreditamos ser. Se você perguntar a uma pessoa como ela é, muito provavelmente os primeiros adjetivos que vier em sua mente é como ela acha que é, ou como ela gostaria de ser. Porque esse é o mecanismo do seu ego: não é a pessoa quem está falando neste momento, é o seu ego vindo à tona. Observo que a gente tem uma tendência a se esconder (inclusive de nós mesmos). No meu primeiro animal escolhi um cavalo com características de liberdade, de não controle, pois é exatamente assim como me vejo, como eu gosto de ser visto. Eu não gosto que o meio me controle, que as pessoas tentem me manipular, porque quero sempre me imaginar livre. O que nem sempre é totalmente verdade, pois veja que as características do meu terceiro animal já dão uma ideia oposta, a de vínculo. Assim, ao passo que gosto de me imaginar independente, a contra partida anseio também por um lar, por um par, por um elo no qual eu seja de alguém (ou de algo) e isto seja também em algum nível meu.

     Por que na minha vida foi importante essa reflexão? A resposta é porque muitas vezes, num momento de raiva ou de impulsividade, eu abandonei coisas e pessoas. Nesses momentos eu me questionava por que estava numa determinada situação fazendo algo. Isso me gerava revolta e um sentimento de “eu preciso me libertar dessas amarras”, mas sem perceber que eu mesmo me colocava as amarras, e permanecia na situação por vontade própria, porque no fundo era exatamente aquilo que tinha buscado para ser feliz. Isso gerava um conflito em mim mesmo. O terceiro animal veio me revelar um indivíduo que gosta de regras, costumes, rotinas, ordens claras. Gosta de se sentir fiel e leal a um sistema de coisas e sentimentos que para ele sejam importantes, ou seja, um indivíduo que busca uma causa maior que si mesmo, para seguir. Com essa análise resolvi parar de fugir, de mim mesmo – como faz o meu cavalo. Eu parei de brigar e de me rebelar com aquilo ao qual me submetia por vontade própria, já que era o que verdadeiramente amava. E foi então que veio o “clique”: eu constatei que toda as vezes que fugia de uma determinada situação que me sentia “domesticado” (eu odeio essa palavra) no fim não terminava mais feliz; o prazer de bancar o indomável, o “em mim ninguém manda”, era provisório, porque depois eu não me sentia mais realizado por isso. Quero dizer que todas as vezes que esperei a raiva passar, contive a paranóia de me achar submisso e me mantive fiel e leal aquilo que combinei previamente, apesar de ser difícil (ao meu ego num primeiro momento), terminava me sentindo mais realizado. Descobri que ser fiel, leal e se submeter a algo, para mim, não tem nada a ver com ser menor ou ser submisso, muito pelo contrário, tem algo de grandioso. Isso mudou a forma como passei a lidar com duas coisas: a Raiva e o Orgulho. (onde entra meu segundo animal).

     Eu notei, tanto através do meu próprio teste, quanto nas pessoas que o apliquei, que muitas das vezes as características do segundo animal têm muito a ver com um mecanismo de defesa da pessoa. Um mecanismo de sobrevivência ou de proteção do eu. E o segundo animal vai falar como você é visto porque é justamente como você está se mostrando aos outros. Como todos nós temos mecanismos de defesa e todos nós temos a tendência a esconder (ou a proteger) quem somos, essas características servem justamente de camuflagem, de defesa. No meu caso, é comum as pessoas me revelarem que quando me conheceram me acharam fechado demais, com um ar arrogante, prepotente, com um jeito meio altivo e orgulhoso, até esquivo, como se fosse alguém que não quisesse “se misturar” aos demais. Mas note que o terceiro animal, que é como de fato sou, quer ser parte das coisas, ser fiel, leal e ainda proteger. Então essa imagem conflita com a do segundo. Todavia faz sentido quando imaginamos o segundo animal como um mecanismo de defesa. Mas por que agir assim?

     Cada pessoa lança mão de um mecanismo de defesa por um motivo muito íntimo, que somente a pessoa poderá se responder. Cada pessoa precisa fazer as analogias e inferências entre as imagens evocadas de cada animal escolhido no seu teste e analisar como se dá a dinâmica desse trio na sua própria personalidade, porque no fim todos compõem o eu. No meu caso, é o medo de estar numa relação de total confiança, em que a outra parte possa se aproveitar a tal ponto da situação, que no fim eu saia prejudicado. É um medo muito profundo de me machucar ao depender das pessoas! Se por um lado eu preciso do contato, por outro lado temo as consequências naturais desse contato, porque vamos combinar: as relações são naturalmente desgastantes e se atritam. O meu terceiro animal é justamente um cão na minha análise porque para mim o cão respeitará o dono e a propriedade até o fim, mesmo sofrendo maus tratos nessa relação. Daí o dito “o cão é o melhor amigo do homem”. E isso em mim sinceramente me assusta um pouco porque vem com isso uma constatação perigosa também: é muito tênue a linha que separa me submeter a alguém (ou a algo) por amor e doação, de me ver numa relação abusiva que beira o sadismo (exemplo clássico vivenciado na minha relação com o meu pai). Meu pai foi um homem que me amava muito, me tratava muito bem, quando são, porém, tinha problemas com álcool, possuía um humor ferino e críticas mordazes. Eu me lembro que na adolescência tivemos brigas épicas, com agressões físicas inclusive – de ambos os lados! Era uma relação tempestiva, embora de muito amor também. Quando eu estava longe dele não via a hora de estar com ele, ele era um grande amigo, porém trinta minutos juntos a gente já se atacava; ele era territorial e controlador e eu não suportava que mandassem em mim... então já viu. Daí que começa todo um conflito que gerará mais tarde um problema com figuras de poder e autoridade, que reverberará nas salas de aula com alguns professores e em algumas empresas com alguns chefes... rs

     Então o segundo animal tende a revelar isso: a imagem que as pessoas estão captando de você porque você está transmitindo assim – até inconscientemente. E caso a imagem transmitida de seu segundo animal seja muito destoante do terceiro, de forma que esteja te prejudicando ou aos demais, questione-se o porquê disso. “Do que estou tentando me proteger?”. “Por que estou agindo assim?”. “O que estou tentando defender, ou esconder?”. “Vale a pena continuar nessa postura?”. No meu caso, quando me percebo me afastando do meio, por estar emitindo uma imagem equivocada, seja de superioridade, de excesso de intelectualidade, de excesso de introspecção, de excesso de vaidade (orgulho), começo a me fazer as perguntas acima. E o engraçado é que tudo isso passa por mim quase despercebidamente, já que carrego uma crença que foram os outros que estavam me afastando, que estavam contra mim, até eu constatar que na verdade era eu quem estava adotando uma postura ou tendo um determinado comportamento que afetava o meio de forma contrária ao que eu gostaria. Ou seja, com isso tento trazer para mim a responsabilidade pelos acontecimentos que estão afetando a mim e aos outros. E considero essa uma atitude muito mais inteligente da nossa parte.

     Apenas desejo a você que esse teste proporcione um ponto de partida para novas reflexões:

  • Qual é a imagem que você tem de si mesmo: é realmente isso o que você é ou consegue ser? (primeiro animal)
  • Essa imagem que você tem de si mesmo vai de encontro ao que você está transmitindo às pessoas? (segundo animal)
  • Como essas duas imagens estão em relação aquilo que você verdadeiramente é? (terceiro animal)

     E no fim lembre-se: você é a união dos três animais, no fundo não existe de fato separação.

terça-feira, 25 de setembro de 2018

A Fé



Existe um local, um espaço, um sentimento, algo dentro de mim, que recorro quando nada mais parece fazer sentido. Quando as respostas foram insatisfatórias; quando as relações ficaram naturalmente complicadas demais; quando uma angústia está me apertando; quando todas as portas parecem trancadas e estou num beco sem saída, então nesse momento me percebo como sou. Um ser pequeno, frágil e dependente. Me sinto nu e incapaz diante da vida. E perante essa constatação franca, que cutuca agressivamente meu ego, me encontro com algo sagrado em mim. Algo maior. Eu encontro a minha espiritualidade, a minha religiosidade e meu corpo se mostra um templo em mim.

Eu estava com dez, talvez onze anos, quando conscientemente conversei com Deus pela primeira vez. Digo conscientemente porque antes desse momento era algo mecânico; orava sem entender direito o que fazia. Mas a partir dessa idade tudo mudou. Eu estava em meu quarto um dia, sentado no chão e me sentindo terrivelmente só como sempre. Era uma tristeza tão grande, eu sentia que a vida não fazia sentido e não entendia qual a razão de sentir aquelas emoções tão difíceis de suportar. Passei por isso por um longo período sem contar nada a ninguém porque me incomodava me imaginar pedindo ajuda para algo que nem sabia explicar o que era. Apesar de ser criança na época, percebia que precisava urgentemente de ajuda, porém eu não sabia como e nem por onde começar a falar; que me sentia só; confuso; angustiado. Quando me lembro desse momento, imagino que chamaríamos isso hoje de depressão, mas creio que foi uma difícil transição da infância para o início da adolescência e como sempre fui ansioso sofri demais; talvez essa tivesse sido a minha primeira crise existencial. Como eu não sabia o que fazer, instintivamente comecei a “conversar sozinho”...

De início me senti tolo. Achava aquilo meio bizarro, temia ser visto como um louco e sentia vergonha do que estava fazendo. “Eu estou falando sozinho!”, pensava. No entanto, de repente senti meu corpo todo arrepiar, meus pensamentos negativos foram se dissipando e senti algo bom tocar meu coração. Era uma sensação tão confortável de paz que me sentia num local seguro e estranhamente comecei a melhorar. Daquele momento em diante descobri que Deus sempre esteve ali comigo, vivia dentro de mim e jamais me abandonaria; naquela tarde combinei algo com Deus: que o procuraria outras vezes e me tornaria seu melhor amigo. Assim como Ele sempre foi o meu desde então...

De lá para cá foram muitas as situações que fiquei entre a cruz e a espada. Entre o carpete e o taco. Foram muitas as crises existenciais, os episódios depressivos, houve pânico, mas sempre me agarrei na minha espiritualidade. Algo me dizia que eu só precisaria fazer isso: ter fé. E daria tudo certo. Quando subia no telhado para acompanhar o nascer do Sol, ao sentir o calor dos primeiros raios da manhã, eu sabia que não estava só. Nas noites que não conseguia dormir, ligava um rádio velho e ao som das canções me percebia conversando com Deus. Ele sempre esteve presente. E é por essa razão que hoje escrevo. Eu escrevo para reforçar a sua fé. Eu escrevo para reforçar a minha própria. E gostaria muito que acreditasse quando digo:

Existe uma força maior regendo tudo isso e você é parte dela!
Quando ninguém quiser te ouvir e todas as portas parecerem trancadas e se sentir só, é chegada a hora de se recolher e orar. Então chore e desabafe com Deus, porque só Ele sabe todas as coisas...
Tudo nessa vida sim vai passar, desde bons amigos até melhores irmãos, desde bens e dinheiro, mas algo de puro e sagrado, que habita dentro de você, será para sempre e estará aí enquanto precisar.
De verdade, nunca caiu uma folha de uma árvore se não foi por vontade de Deus; estamos sempre no lugar certo no momento certo com as pessoas que precisamos aprender e ensinar, então se acalme porque as coisas vão se conectar e no fim farão parte de um todo magistral! Eu nunca tive dúvida.
Você ainda vai rir disso. Você ainda vai chorar disso. Você ainda vai agradecer por isso! E vai passar... Vai cicatrizar. Você vai esquecer. Vai sobreviver! Então não perca as esperanças. Não perca a sua fé.

Sempre busquei ter a mente lógica e ser um estudioso da ciência. Mas sou um filho de Deus!

domingo, 26 de agosto de 2018

A formação para Gestão de Pessoas



Toda organização (seja ela pública, privada, uma ONG etc.) podemos dizer que é composta por um conjunto de elementos físicos e não-físicos. Como exemplos de elementos físicos podemos citar resumidamente a matéria prima, o maquinário, as instalações, o layout produtivo, as pessoas envolvidas etc. Como exemplos de elementos não-físicos podemos citar, também de forma breve, a tecnologia de informação, a contabilização, o conhecimento, o planejamento, a comunicação, a cultura, a construção de uma hierarquia e como se dá o processo decisório (mais verticalização; mais horizontalização) etc. Toda organização impacta e também será impactada pelos elementos (físicos e não-físicos) externos, como por exemplo a sociedade na qual está inserida; o meio ambiente; o seu público alvo; o governo (impostos, legislações, informações obrigatórias etc.). A chave do bom funcionamento da dinâmica desses elementos está na sua gestão. É a administração da organização.

De forma resumida (mas nem tanto) expus acima o principal escopo de ensino de um curso de Administração de Empresas – do qual tenho formação. Nesse curso você vê um menu de teorias e técnicas e perpassa por todas as áreas e setores que existem numa organização, através das disciplinas. É um curso amplo, genérico, que entrega o que se promete: uma visão sistêmica do todo.

Quando falamos em administrar uma organização, de todos os elementos que eu citei, na minha opinião, hoje mais do que nunca o calcanhar de Aquiles é o fator Humano. A tecnologia da informação é importante. A comunicação é importante. A gestão do conhecimento, o planejamento e o cumprimento da legislação são importantes. Todos os elementos têm a sua devida importância. No entanto, por trás de todos esses elementos existem o quê? Pessoas. Ao isolarmos cada organização, cada área, cada setor, cada elemento, cada processo, para se chegar numa matriz originária, vamos descobrir que ali reside um ser humano. Portanto, é verdade que essencialmente são as pessoas que levam a organização em direção aos objetivos esperados. E dessa forma, faz com que a Gestão de Pessoas seja hoje o braço direito da administração de qualquer empresa. E é verdade também que será a gestão mais difícil de todas, porque envolve o elemento mais complexo de todos, pois cada ser humano é único, dotado de subjetividade e influenciado por fatores biopsicossociais.  

A questão é: o curso de Administração de Empresas capacita para gerir pessoas? Não. (E agora os administradores vão cair de pau em cima de mim rs rs). Não capacita. Em Administração de Empresas você estuda teorias, aprende técnicas, há uma bagagem de cálculo, mas não se vê profundamente e não se tem muitas disciplinas voltadas à Gestão de Pessoas. E não sei também se esse é o foco do curso, pois como já dito acima, o curso entrega um conhecimento amplo e mais generalista da Administração, e depois de formado o profissional vai se especializar na área que ele quer ou se identificou mais. Como acontece em muitos outros cursos de graduação! Não tem nada de errado com isso. E eu adorei o curso que fiz, se voltasse atrás teria escolhido novamente sem sombra de dúvida, mas eu já até falei sobre isso aqui; no meu segundo ano de faculdade tive a oportunidade de liderar uma equipe e eu pedi para sair. Eu não consegui! Isso significa que todo administrador não conseguirá? Óbvio que não. Não é correto generalizar. Mas – na minha opinião – o administrador tem uma tendência a ser mais objetivo, mais burocrático, mais técnico, talvez até mais rigoroso e a perceber e compreender menos as questões subjetivas dentro da organização e os fatores biopsicossociais que podem estar impactando os trabalhadores. Não é uma característica ruim essa, é apenas uma visão. Se eu fosse sintetizar numa frase, eu diria que: “o administrador tem uma tendência a enxergar a relação Empregador x Empregado como unicamente uma relação comercial.

E hoje a gente sabe que não é bem assim...

Aí vou trazer outra questão: então seria aquele com formação em Psicologia o profissional mais indicado ao Recursos Humanos, à Gestão de Pessoas? Não. (E agora os psicólogos vão cair de pau em cima de mim rs rs). Eu não tenho graduação em Psicologia, sou graduado em Administração, mas na minha opinião, pelo que observo, o curso de Psicologia também não capacita o psicólogo (como precisaria) para dar cabo da organização. Me desculpem. Eu me pós-graduei em Recursos Humanos, depois fiz Gestão de Pessoas, e fiz Psicologia Organizacional e do Trabalho, e atuo nessa área há anos. Se existe déficit na formação do administrador para dar cabo desse desafio, ao psicólogo também. A visão aí vai radicalmente para a outra ponta. Eu sou apaixonado pela Psicologia, como adoro os meus amigos psicólogos, tenho planos até de cursar a graduação, mas pelo que observo (com o perdão do engano) é uma ciência que, se o estudante não é bem orientado quando ele opta pela Organizacional, quando ele cai na organização de fato, ele tem dificuldade pois tem uma “tendência a ser humano demais. Se o administrador tende a enxergar a relação trabalhista como puramente comercial, o psicólogo é o inverso, ele tende a esquecer que é business. Que é um negócio, dentro de um sistema capitalista, amarrado por um contrato de trabalho. Ou seja, as partes em comum acordo se acertaram que o empregador pagará “x” para o empregado entregar “y”. Ou seja, se em algum momento o empregado entregar menos, seja em horas trabalhadas ou em quantidade produtiva, está errado. Há um descumprimento aí, que tem que ser averiguado.

E o psicólogo certamente argumentaria que por trás do trabalhador existem “n” fatores que podem estar o impossibilitando de cumprir com o combinado (os fatores biopsicossociais). Ok, é compreensível, vamos então averiguar o que se passa e veremos o que é possível ser feito. Mas a questão é: quanto tempo temos disponível para isso? Lembrando que estamos amarrados por um contrato, numa relação de negócio e estamos equacionando tempo x custo x benefício. E o psicólogo tenderia a achar isso muito frio, muito calculista, muito pragmático. Mas devemos lembrar que, caso a organização não seja uma instituição filantrópica, seu objetivo primordial é o lucro. O empresário começa uma atividade econômica porque ele quer obter lucro. E não tem nada de errado com isso, estamos num sistema capitalista – se é bom ou mau, é este o que temos. Essa visão demasiadamente humana de alguns psicólogos, quando vão para a organização, tem mais a ver com a Psicologia Social do que propriamente com a Psicologia Organizacional e do Trabalho. Se o Estado não tem uma estrutura que possa dar suporte ao trabalhador, vamos jogar essa bola ao empresário?

Numa aula uma professora (psicóloga) nos pediu a seguinte reflexão: “você tem uma babá que cuida de seus filhos enquanto você precisa trabalhar. Um dia a babá te liga que não poderá ir trabalhar porque seu filho está doente. Na semana seguinte ela liga e diz que não poderá ir trabalhar porque terá consulta médica. Depois ela liga que não poderá ir trabalhar por um outro motivo qualquer (mas justificável). Todas as vezes que a babá falta ela justifica, mas ou você precisa faltar do seu trabalho ou precisa se virar com as crianças. Quanto tempo você mantém essa situação, sem trocar de babá?”. Note que em nenhum momento está se julgando a conduta da babá no exemplo, pois ela está faltando ao trabalho por motivos justificáveis. Muito compreensíveis. Mas será que é o empregador quem dever arcar com esse custo? E por quanto tempo ele consegue fazer isso?

Na minha visão, o profissional que atua em Gestão de Pessoas tem que entender que a relação é comercial então precisa sim existir um certo pragmatismo; a atividade econômica visa o lucro e não convém perde-lo de vista (para o bem de todos: empregador, empregado e governo!). A contrapartida o capital mais importante de uma organização não é tecnologia nem são as máquinas, já se sabe que são as pessoas, que hoje mais do que nunca é chamado de Capital Intelectual. E ele necessita sim ser valorizado. Mas valorizar não significa sair concedendo aumento de salário ou dar mais benefícios indiscriminadamente, ou fazer vista grossa para tudo, porque se isso não é pensado econômica e financeiramente falando, é uma atitude irresponsável porque a longo prazo coloca a própria atividade econômica em risco. O ponto foco da Gestão de Pessoas é ser capaz de enxergar o trabalhador com seus pontos fortes e pontos a serem trabalhados, levar em consideração que a motivação é intrínseca, portanto é pessoal. Alguns funcionários irão trabalhar exclusivamente pelo salário para pagar contas, outros já gostam do que fazem, outros gostam do ambiente e dos colegas, outros gostam da oportunidade de desafio que foi dada, outros gostam de aprender e querem crescer profissionalmente etc. Cada funcionário tem as suas próprias demandas, as suas próprias necessidades, ele gosta e quer que a empresa perceba isso. E a empresa deve fazê-lo, dentro do que é possível ser feito em dado momento.

A questão que fica então é: qual seria a melhor formação para se atuar em Gestão de Pessoas? Não tem. (E agora quem está estudando pra isso vai cair de pau em cima de mim rs rs). Sinceramente falando, eu não sei se existe uma graduação específica. Assim como não sei se é necessário ter uma graduação para isso. Conheço empresários que não tem formação superior e dariam uma verdadeira aula nesse quesito. Assim como conheço ótimos gestores que são graduados em Comunicação, em Engenharias, em Direito, em Economia etc. Talvez o foco nem seja o curso, mas sim o indivíduo. Prefiro pensar que um gestor precisa ser técnico o suficiente para não perder de vista o negócio em que atua, mas precisa também ser humano o suficiente para não perder de vista aquilo que ele tem nas mãos, o seu capital intelectual! E quando bate uma dúvida gosto ainda de recorrer aquela célebre frase do Jung: “conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.

sábado, 11 de agosto de 2018

O psicopata no trabalho



Existe uma questão que sempre busquei entender, que trata da origem de nosso caráter. Uma linha da ciência diz que somos folhas em branco ao nascer e é o meio (os nossos cuidadores, a escola, a sociedade etc.) o responsável por nos construir enquanto pessoa. Outra linha da ciência já considera que, em partes, seríamos sim folhas em branco, porém não totalmente, há uma parcela herdada, mesmo quando estamos falamos de caráter.

Faço sempre essa reflexão quando me deparo com uma pessoa com um desvio de caráter muito acentuado. Quem de nós nunca se deparou com um indivíduo assim, não é? E quando encontramos uma pessoa com essa característica no ambiente organizacional?

Certa vez, trabalhava numa empresa e estava numa sala numa situação bastante complicada para uma pessoa, uma funcionária. Havia acontecido uma série de situações, bastante sérias, e essa pessoa tinha sido descoberta como a autora dos atos e eu estava presente no exato momento da revelação da verdade. Confesso que a atmosfera na sala era tão tensa e havia o compartilhamento de um constrangimento alheio por todos os envolvidos, menos pela autora. A todo instante, eu só olhava, quase que desesperadamente, para o rosto dessa pessoa e eu buscava ali em seus olhos algum sinal de arrependimento, culpa, e sequer vi uma faísca de constrangimento! Eu nunca me esquecerei daquele momento. Como nunca me esqueci daquele olhar...

Alguns chamam de mau caráter. Outros, de perverso. Mas estamos falando de psicopatas. Pessoas com transtorno de personalidade antissocial. Segundo a literatura científica, estima-se que sejam 4% da população, sendo 3 homens para cada mulher. Divididos entre graus que vão de leve, moderado, até grave, eles estão entre nós e é certo afirmar que já trabalhamos com algum, em algum momento de nossa vida. Pessoas muitas vezes brilhantes. Inteligentes, comunicativas, sociáveis, charmosas, sedutoras até; pessoas absolutamente racionais, que sabem fazer a cena muito bem. Jogam muito bem o jogo! O jogo das relações sociais, de poder; eu diria que são políticos natos, nasceram com uma articulação impressionante.

Aqui cabe fazer uma diferenciação entre o que seria um traço e o que seria o transtorno de fato. O traço é a característica. Quem tem o transtorno possui os critérios (listados no DSM-V Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, por exemplo). Porém, nem todos que apresentam traços terão o transtorno. E já li alguns psiquiatras dizendo que ter um traço nem sempre é ruim, até pelo contrário, pode ser muito bom para um indivíduo. Eu por exemplo posso dizer que teria um forte “traço psicopático”, que sempre gozaram de mim por conta da minha excessiva racionalidade e da baixa emotividade. Sou muito cerebral, e por isso pouco empático, tenho dificuldade de me pôr no lugar das pessoas e compreender rapidamente suas necessidades. Afirmo que a minha personalidade é um tanto calculista, sou sim um pouco frio, controlado e contido, detalhista e metódico, e um tanto quanto “distante emocionalmente” das outras pessoas. Mas eu jamais seria capaz de prejudicar objetivamente, conscientemente, alguém! Isso vai contra todos os meus princípios, contra o meu caráter, contra a minha própria criação. Não fui educado assim.

Mas confesso que ter o traço me ajuda na minha profissão e pode ajudar em outras. Veja que a descrição que dei cabem bem para um contador, para um engenheiro, para um desenhista técnico. São úteis para mim quando preciso calcular uma folha de pagamento ou uma rescisão de contrato de trabalho, porque consigo fazer isso com uma precisão quase cirúrgica. Características boas até para um juiz. Eu por exemplo sou lembrado pelo senso de justiça e procurado às vezes para arbitrar desavenças (por enxergar o fato com frieza e os envolvidos sem vínculo emocional). Sou um observador atento e detalhista. Sou intuitivo. Faço umas boas interpretações e análises. Então, ter traço nem sempre é ruim. O traço é uma coisa e o transtorno em si é uma outra completamente diferente. E isso vale para todos os transtornos de personalidade.

E note que grifei acima a palavra consciente porque psicopatas têm consciência de seus atos, por isso não devem ser considerados doentes mentais. Não há tratamento nem cura, estamos falando de personalidade. É uma maneira de ser. Uma forma de se exercer e existir no mundo, onde o outro não tem valor, o outro é só um meio para se atingir um objetivo.

As perguntas do milhão são: como identifica-los? E como lidar com eles?

Para responder a primeira pergunta, gostaria de lembrar que aprendemos desde pequenos (e a gente sempre esquece) que não se julga um livro pela capa. Da mesma forma que não se começa a ler o livro pelo fim; a gente tem que partir da primeira página. Um funcionário que apresente sinais de desvio de caráter numa empresa (como mentir, omitir, distorcer, trapacear ou até furtar ou roubar) certamente já tem um histórico. Ele provavelmente tem uma série de experiências profissionais anteriores obscuras. Mal resolvidas. Mal contadas. O passado desse profissional quase sempre será marcado por experiencias profissionais meio parecidas ou será um passado nebuloso, conflituoso, ou de difícil acesso; onde certamente ele próprio dificulta o acesso. E quando tocado no assunto ele sempre vai se colocar como a vítima e ter um discurso de pena. Aí entra o sinal de alerta: cuidado com aqueles profissionais que são perfeitos demais e chegam numa entrevista com um currículo irretocável (ninguém é perfeito assim, de verdade). Especial cuidado com aqueles profissionais que têm sempre um discurso que foram ou que são vitimizados. Psicopatas são especialistas em jogar com emoções alheias. Preste atenção em subordinados ou em colegas de trabalho de mesmo nível hierárquico ou de níveis mais baixos (só serão de níveis acima se tiverem algo a ganhar ou se você estiver no caminho obstruindo sua escalada) que te apresentem uma realidade embutindo já uma interpretação parcial e tendenciosa dos fatos. Eles geralmente não te dão tempo nem espaço de raciocinar por si diante das situações e ficam sempre tentando conduzir a sua interpretação (que na verdade é a interpretação que querem que você tenha). Essa é a manipulação! E tem sempre uma finalidade por trás (pode ser poder, status, dinheiro ou puramente diversão). Nem todo manipulador é um psicopata, mas todo psicopata será um manipulador nato. Estes profissionais sempre estarão envoltos a conflitos, mas nunca ligados diretamente. Gosto de dizer que sempre os veremos próximos do fogo, mas nunca conseguimos liga-los ao incêndio!

Responder a segunda pergunta talvez seja ainda mais difícil, porque mais difícil do que perceber uma pessoa genuinamente mau caráter, é saber lidar com uma depois da constatação. Acredito que, como o ditado, “a ocasião faz o ladrão” (quando o ladrão é mau caráter!). Para os profissionais, eu recomendaria que se você perceber que uma pessoa da empresa tem uma má índole, não crie ocasiões que possam te prejudicar. Não confidencie segredos. Não deixe senhas gravadas no seu computador. Evite comentários de chefes em comum ou de outros colegas que possam ser usados posteriormente contra você. Mantenha uma distância profissional sadia. Seja profissional! E acima de tudo: seja o mais racional possível ao lidar com essa pessoa especificamente. Indivíduos com um mau caráter jogam com as emoções alheias, isso significa que pessoas mais emotivas, que dão uma maior abertura aos sentimentos, tendem a ser alvos mais fáceis da manipulação, pois são naturalmente mais vulneráveis. Neste caso, evite excessos de emotividade e busque sempre um senso autocrítico para o seu comportamento. Para as empresas, eu recomendaria basicamente duas medidas: regras claras e punições efetivas! O psicopata no trabalho não deixaria de cometer um deslize só porque vai prejudicar um colega, mas certamente deixará de cometer se tiver certeza de que será responsabilizado. Ele tem consciência de seus atos. Se souber de antemão que na empresa em que trabalha as normas de conduta são claras, são sérias e se for pego infligindo haverá consequências relevantes para si, ele se adéqua. Ou no mínimo perde campo de atuação. O psicopata sempre vai existir em todas as organizações, porque ele está em todas as camadas e áreas da sociedade, mas ele só ganhará espaço de atuação na empresa em ambientes não estruturados, ambientes que não tenham regras claras ou que estas sejam constantemente relativizadas, e principalmente onde não exista uma punição efetiva perante a constatação de um mau comportamento ou de um comportamento não adequado.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

O QUE APRENDI NOS 10 ANOS DE BLOG: INTEGRAÇÃO


Sinto-me incapaz diante de pessoas negativas. Poucas coisas na vida me dão mais tédio, desprazer, do que lidar com pessoas assim. Sinto preguiça, tenho extrema dificuldade em exibir a essas pessoas uma outra perspectiva de vida menos carregada, menos pessimista, porque via de regra elas resistem, vitimam-se, agarram-se no próprio comportamento, e no fim termino inevitavelmente me sentindo exaurido. Incomodado. Consumido. Contaminado.

Tenho dificuldade de entender qual seria a efetividade de olhar para as coisas enxergando o que há de pior, sem tentar ao menos buscar algo de positivo. Não vejo ganhos em ser negativo. E por esse motivo sempre que posso fujo do contato. Quando não posso, limito-me a ficar quieto, evitando absorver a negatividade e criticando a pessoa em pensamento.

Mas isso é mais fácil, não é? É mais fácil por esse caminho pelo qual tendo a percorrer. Colocar-me numa posição diferente, superior, de onde eu possa julgar, sem buscar entender quais fatores estariam por de trás de toda negatividade. E o mais importante: quais aspectos talvez estariam sendo refletidos, estando em mim mesmo, mas não posso aceita-los?

Fazer essa reflexão dá mais trabalho. Mas também é o mais justo com a pessoa. E comigo mesmo.

Em abril esse blog completou 10 anos. Em junho eu fiz 30 anos de idade. Quando iniciei esse espaço, no auge dos meus dezenove anos, eu acredito que uma das minhas maiores dificuldades era aceitar pessoas diferentes de mim. E continua sendo até hoje. Porém hoje eu percebo melhor, e a cada dia com maior claridade, que quanto mais me revolto com uma pessoa e não sou capaz de convencê-la do contrário, estou revelando mais os aspectos de uma necessidade minha. Uma necessidade de controlar o outro, de fazê-lo mudar, de fazê-lo entender o quanto tenho razão. É dominação, prepotência e praticamente uma mentira que tento contar a mim mesmo, pois posso no fundo nem ter razão de fato.

Hoje tenho mais consciência que aquilo que julgo como sendo muito certo, que funciona muito bem, que é óbvio, muitas vezes se encaixará perfeitamente apenas para mim, na minha vida, e que não necessariamente pode ser aplicado satisfatoriamente às outras pessoas, porque elas terão outras necessidades e partiram de outros contextos. Entendi que o “óbvio” é uma palavra que não existe nas relações humanas e que nós realmente muitas vezes servimos de espelhos uns aos outros.

É difícil aceitar isso, pois dói assumir que aquilo que mais nos incomoda no outro também habita em nós mesmos. Exige muita maturidade e franqueza. E coragem, de encarar aquelas sombras que não gostamos nem de tocar no assunto. Mas eu já descobri que não “tocar no assunto”, não olhar para nossas sombras só faz com que elas se fortaleçam. E esse mecanismo termina gerando as projeções externas.

Por isso, vos digo: o mundo tal como você vê, não passa muito longe da extensão de seu próprio interior.


Quanto mais esse interior é negligenciado, mais o que está do lado de fora incomoda, porque se escancara na sua frente tudo aquilo que você não pode aceitar. Mas existe um caminho de paz, ele se chama Autoaceitação. E tudo começará com a sua Integração.

A palavra “integração” vem de íntegro, que significa “inteiro”, “completo”, “pleno”. E é isso que eu desejo a você: que você se torne uma pessoa íntegra. Que você dê as mãos para aquela sua parte que você não aceita, não a entende, que você até evita de olhar! Abrace essa parte, com carinho. Aproprie-se daquilo que é seu também, daquilo que veio aí com você, daquilo que você é, daquilo que faz parte de você. Sem julgamentos. Todos temos partes boas e partes “nem tão boas assim”, e está tudo bem. Não há problemas nisso. Tire esse peso. Tire essa culpa. Não precisa ser assim. Faz parte também ser do jeito que você é. E quanto mais você compreender isso, quanto mais você aceitar isso, quanto melhor você integrar isso dentro de si, mais pleno você viverá.

E com o tempo você acabará percebendo que as pessoas são boas também, e assim como você, elas também estão aqui tentando aprender com as próprias limitações. Isso vai te desarmar e você passará a ver a vida com outros olhos. E aí entra uma percepção bacana também, pois tudo aquilo que você admira nas outras pessoas, também existe dentro de você!

FAÇA UM EXERCÍCIO:
Pense numa pessoa, de seu convívio, que você não gosta, que incomoda muito você. Em seguida, liste num papel as principais características que essa pessoa possui que te irrita muito. Agora, faça a seguinte reflexão:

“Em quais momentos de sua vida, você age (ou já agiu) com essas mesmas características?”

Tente ser o mais sincero consigo mesmo, e se surpreenderá com o quão pode se parecer, em algumas circunstâncias, com essa pessoa que tanto te incomoda. Agora, se mesmo assim não conseguir se enxergar, mostre o papel com a listagem para uma pessoa que te conheça muito bem e pergunte se você teria alguma das características... 

A grande moral da história é que o que está te incomodando tanto nem é a pessoa em si, é o que você se vê nessa pessoa, mas não pode aceitar. Entenda. Aceite. Integre-se.

sábado, 10 de fevereiro de 2018

Inteligência Positiva: na Vida e nas Empresas


Algo não deu certo na sua vida? Você acha que é um fracasso? Por causa de uma pessoa ou de uma situação que aconteceu lá atrás, isso atrapalha a sua vida até hoje? Você não consegue ver saída para alguma situação? Você se julga uma pessoa triste e acha que tudo dá errado? E se eu disser que isso acontece porque você quer assim? De todas as formas de se olhar para a vida, podemos dizer que em algumas nos enxergamos capazes, batalhando por algo acreditando que tudo vai dar certo; em outras desconfiamos de nossa capacidade imaginando o pior do que poderia acontecer. Você escolhe. Todos os dias. E a sua escolha se concretiza!

Durante muito tempo vivemos nossas vidas como se não tivéssemos controle sobre ela. E isso é engraçado. De fato muitas coisas não temos mesmo controle. Como por exemplo. Não controlamos se nascemos ricos ou pobres. Não controlamos se seríamos acometidos por alguma enfermidade que de repente surge. Não controlamos se após apostarmos todas as fichas numa relação, seja de trabalho seja de amor, de repente a outra parte nos dispensa. Sabemos que esses acontecimentos impactam em como vemos a nossa vida. Mas preste atenção: não temos o controle do que a vida vai fazer conosco, mas temos sempre o controle do que nós vamos fazer com a nossa vida!

Muitos estudos estão tentando entender o que nos faz verdadeiramente felizes. E alguns desses estudos já estão bem avançados nos trazendo surpreendentes descobertas. A primeira é que existe sim um componente genético, isso não dá para negar. Sabe aquela cena que você vê, que parece que uma família inteira é negativa? Ou que todo mundo ali tem mais ou menos o mesmo jeito de pensar e enxergar a vida? Isso é verdade. Tanto bom quanto ruim. As pesquisas mostram que pelo menos 50% da forma como enxergamos a felicidade é hereditário. Então se você nasceu numa família que parece que todos têm uma leve tendência ao pessimismo ou a puxar sempre para baixo, foque nos seus outros 50%! E não culpe ninguém! Pois eles só estão se deixando levar pelo outro lado, incentive-os você sendo a mudança que eles precisariam enxergar. Quem sabe você não trará a mudança de visão a sua família? 

Sabe aquela outra crença que diz que dinheiro traz felicidade? Bem, até certo ponto. As pesquisas mostram que uma vez supridas as necessidades humanas básicas, que são comida, bebida, moradia, segurança, uma vida minimamente digna, tudo o que vier a partir disso é dispensável em relação à felicidade. Então você não precisa daquele carro importado, nem viver no bairro A com o emprego x naquela remuneração y; preocupe-se em ter o suficiente para viver e o resto será uma mera consequência do teu trabalho. 

As pesquisas sobre felicidade, sobre psicologia positiva, sobre viver uma vida plena estão chegando às seguintes conclusões: em torno de 50% vem de fábrica, é genética; dentro de até 15% estariam os fatos e os acontecimentos do decorrer de sua vida (casamento, filhos, mortes, saúde, dinheiro, desemprego, trabalho etc) ou seja aquilo que 'não temos tanto' controle pois “é o que a vida faz conosco”. E os 35% restantes? - você deve estar se perguntando. É a sua opção. É justamente aí que você vai trabalhar! Pois é aí que entra a mágica do negócio. “É o que nós fazemos com a nossa vida.” Os pesquisadores têm percebido que nesse percentual entrariam a forma como interpretamos o que nos acontece; a forma como lidamos ou reagimos a esses acontecimentos; e a cereja principal desse bolo: se a nossa existência estaria ou não pautada num propósito maior! Você já se perguntou qual é o seu propósito nessa vida? O que faz o seu coração bater mais forte, o que você ama tanto, busca tanto nessa vida? Algo que você seria capaz de fazer de graça se fosse preciso. Essa é a chave da sua felicidade! Quem vive alicerçando sua vida na busca por um propósito maior vive mais feliz, vive plenamente.

Vamos trazer agora para as organizações. Quantas vezes o profissional de RH se depara com uma reclamação de um trabalhador sobre desconto em seu contracheque? Ele está recebendo ali horas extras, prêmio, abono, salário e a empresa lhe concede benefícios – sem falar que ele está empregado apesar de muitos não –, mas o colaborador foca no contracheque apenas naqueles minutos descontados de seus atrasos ou do desconto referente a INSS! Ele perde a noção de tudo que está recebendo e foca justamente naquilo que está sendo descontado. Quantas vezes um gestor se depara com uma reclamação de desmotivação de colaborador que não está satisfeito com algo? Esse colaborador pode ter inúmeras regalias e benesses no setor de trabalho (e muitas vezes tem mesmo), mas no dia em que ele resolve acordar e vir trabalhar com o pé esquerdo e seu gestor chamar sua atenção ou lhe aplicar uma advertência, ele passará a acreditar que ali é o pior local do mundo para se trabalhar! Ele perde a noção de tudo de bom que existe ali e foca apenas na situação que considerou negativa. Parece engraçado, mas isso acontece e se essa situação não for trabalhada, ele sai da empresa – ou fará de tudo para sair! Porque está dimensionando uma situação isolada para pior. E esse é o papel da Psicologia Positiva enquanto Psicologia Organizacional. Mostrar o todo! Trazer o outro lado da moeda e fazer o colaborador refletir a situação. Cabe à empresa e aos líderes focarem no positivo dos colaboradores e demostrarem sempre o que há de bom; no que ele é melhor, quais são as suas forças e virtudes e o que ele ganha com isso. Porque no fim vamos combinar que quem procura acha. Se você procura defeitos no seu colaborador, no seu gestor, no seu trabalho, na sua empresa, você encontra. Se você procura as qualidades, as características positivas e resolve focar no que está certo, no que está bom e melhor, você enxerga diferente também. A questão é: onde você quer focar? 

Durante muito tempo se focou, não só nos trabalhadores nas organizações, como nas pessoas de um modo geral, nos erros do indivíduo, nas suas falhas de comportamento. A Psicologia historicamente fez isso. Acreditar que um indivíduo saudável é aquele ausente de doença mental, ausente de sintoma. Todavia, podemos nos julgar SERMOS saudáveis, independentemente de ESTARMOS com alguma doença. A doença é transitória, é um estado, já a saúde é muito mais do que isso, é uma orientação, é uma escolha. O questão é polêmica, é subjetiva, mas se trata justamente de onde a Psicologia coloca o enfoque. Jamais se negar um tratamento pois problemas precisam ser tratados, precisam ser encarados e precisam sim de atenção – com profissionais adequados –, mas a vida é muito mais do que os problemas. Problemas vem e vão, mas o que nós fazemos com eles, o que nós fazemos a partir deles faz toda a diferença na nossa vida. É aquela velha história: não se chora sobre leite derramado. Uma vez que o leite já derramou não adianta reclamar – não se muda passado! A questão é: o que você vai fazer, daqui para frente, para mudar o rumo dessa história? Que comportamentos precisa mudar, que atitudes precisa tomar, de que forma precisa enxergar essa situação, para que daqui para frente ela seja diferente? Seja na vida ou nas organizações.

Pautar a nossa vida ou uma gestão empresarial em cima de erros ou de falhas não dá certo. Não resolve. Precisamos focar na satisfação, no engajamento, nos relacionamentos e em propósito de vida!


sábado, 13 de janeiro de 2018

A fidelidade e a lealdade no mundo do trabalho


“O que acham? Havia um homem que tinha dois filhos. Chegando ao primeiro, disse: 'Filho, vá trabalhar hoje na vinha'. E este respondeu: 'Não quero!' Mas depois mudou de ideia e foi. O pai chegou ao outro filho e disse a mesma coisa. Ele respondeu: 'Sim, senhor!' Mas não foi. Qual dos dois fez a vontade do pai?” Mateus 21:28-31


Fidelidade e lealdade, duas palavras que sempre chamaram a minha atenção, desde sempre. Ainda me lembro da primeira vez que eu as ouvi juntas numa mesma frase sendo postas como sinônimas. Da mesma forma como penso ainda hoje, eu já sabia naquele exato momento que apesar de estarem sendo postas naquela ocasião como idênticas em significado, a mim haviam diferenças sutis mas profundamente essenciais para se caracterizar onde começaria uma e terminaria a outra. Sempre refleti profundamente o significado íntimo dessas duas palavras, a tal ponto que eu diria que para mim elas compõem as palavras mais importantes da minha vida! Sinceramente falando. Mas afinal, o que seriam fidelidade e lealdade?

Para mim fidelidade está ligado ao respeito a uma imagem, a um status, a uma condição, é a responsabilidade a um compromisso assumido, seja este de qualquer natureza, podendo ser entre amigos, entre cônjuges, entre família, numa relação profissional. Já a lealdade ao meu ver está ligado a um companheirismo, a uma parceria; quando penso nesta palavra automaticamente penso em presença física, me vem na cabeça a palavra “lado”, como se lealdade me significasse estar ao lado de alguém, permanecer junto dessa pessoa em qualquer condição. Enquanto para mim a fidelidade estaria mais nos campos conceitual, ético, moral, teórico e pactual das relações, a lealdade seria a materialização disso, seria a vivencia, seria a prática das relações.

Vou dar alguns exemplos. Como acontece com quase todas as pessoas, cada um de nós tem inúmeros amigos e com cada um deles temos uma forma específica de nos relacionar. Eu me lembro na minha adolescência, por exemplo, que eu tinha amigos que discordavam de mim sobre algumas posições minhas – o que é perfeitamente natural. Esses amigos comentavam com outras pessoas a nossa divergência de opiniões, sendo por vezes críticos e ácidos em seus comentários ao meu respeito, algumas vezes beirando a fofoca e a intriga. Quando essas conversas, que eram feitas pelas minhas costas pelos meus próprios amigos, chegavam aos meus ouvidos eu ficava triste e chateado. Mas o interessante é que esses mesmos amigos eram aqueles que eu tinha total liberdade para ligar de madrugada para desabafar ou solicitar uma ajuda que jamais foi negada! Eram os amigos que ficavam literalmente ao meu lado nos melhores e nos piores momentos da minha vida. Eles foram sempre leais à nossa amizade. Mesmo sendo infiéis a mim muitas vezes. Podiam falar mal de mim pelas costas mas eram de uma profunda parceria como se jamais pudessem negar um pedido meu. O inverso também era verdadeiro. Tive amigos que nunca me traíram, mas em compensação eu jamais pude contar plenamente, pois em certas ocasiões tiveram justificativas relevantes para falarem não para mim. Esses em particular foram sempre fiéis a mim. Mas nem sempre leais a nossa amizade...

Vemos também dinâmica parecida no mundo empresarial. E os gestores em particular percebem isso no dia a dia. Há aqueles funcionários que se solicita uma tarefa extra imprevista e mais trabalhosa e, pelas costas do gestor, eles se rebelam, xingam, falam mal da empresa, fazem um carnaval no setor. Mas pontualmente cumprem exatamente o que tem que ser feito! Eles são fiéis à empresa? Não. Mas são leais ao trabalho. Eles questionam, retrucam, às vezes falam mal da empresa ou batem de frente com o líder, mas em seguida fazem além do trabalho que é preciso ser feito, estranhamente vestindo sempre a camisa da empresa. Por outro lado tem aqueles funcionários extremamente educados, responsáveis e pontuais com suas obrigações, mas que também fazem apenas a sua parte, mais nada. São limitados, inflexíveis, não vão um milímetro além do que fora previamente acordado no contrato de trabalho. Tanto que numa situação imprevista e urgente, o líder chega a pensar duas vezes antes de fazer uma solicitação extra de última hora a esses funcionários. Pode-se dizer que eles são fiéis a empresa porque cumprem com o seu papel ali dentro, mas dizer que eles seriam funcionários leais? Eu teria minhas ressalvas...

No ambiente organizacional é extremamente oportuno ao líder saber distinguir quem é o que ali dentro. Eu costumo dividir um grupo de funcionários de uma empresa em 4 subgrupos básicos: 1-aqueles que são fiéis, mas não são leais; 2-aqueles que são leais, mas não são fiéis; 3-aqueles que não são nem fiéis nem leais; 4-aqueles que são fiéis e são leais. Preste bastante atenção ao primeiro e ao segundo subgrupo (e faça você, enquanto líder ou empregador, uma reflexão do que é mais importante para si: fidelidade ou lealdade? – a partir dessa resposta você saberá melhor quais estratégias utilizar com cada um); o terceiro subgrupo dispense imediatamente, ele nem deveria estar mais na sua empresa; e o quarto promova se possível o quanto antes. Em minha análise, o primeiro e o segundo subgrupos são importantes porque são os que carregam e mantém a empresa; o terceiro subgrupo puxará sempre para baixo por isso precisa ser identificado e eliminado o quanto antes!; já o quarto, e será o menor subgrupo no ambiente organizacional, é aquele disposto a entregar mais, que traz potencial de empreendedorismo corporativo, precisa ser bem estimulado e ser criado um ambiente favorável pois neste subgrupo estão os funcionários com cabeça de dono!

E para você, o que é fidelidade? E lealdade? Qual dos subgrupos pesaria mais: o primeiro ou o segundo? Faça uma reflexão: divida as pessoas com quem convive em quatro subgrupos. Quais seriam as pessoas em sua vida que você deixaria no terceiro subgrupo, vale a pena manter essas relações? Quais seriam as pessoas que você deixaria no quarto subgrupo, você tem as valorizado?