Obra de Sergey Galanter
Eu não sei vocês, mas costumo sempre observar a sociedade, os movimentos sociais, e costumo prestar atenção aonde o fluxo se encaminha. Me lembro que até cheguei a prestar Ciências Sociais quando mais novo, tamanha era a paixão por esse assunto. E ligando à Psicanálise, Freud também se interessou pela sociedade no desenvolver de sua teoria. De fato, seria impossível pensar a Psicanálise sem pensar a sociedade da época. E refletindo sobre isso, se pensarmos que a sociedade vitoriana de Freud difere bastante de nossa atual sociedade: como estaria a Psicanálise hoje? Embora tangencie por aí, o intuito da postagem de hoje não é bem esse. É apenas dividir algumas reflexões que tenho feito ultimamente. Sem qualquer pretensão outra, além de pensarmos.
Quando observo a História, vejo que o masculino sempre prevaleceu no poder. Não falo aqui de gênero. Tampouco pretendo reforçar estigmas em relação a isso. Mas se pensarmos que o homem é um ser com um órgão sexual voltado para fora, enquanto o órgão sexual da mulher é voltado para dentro, só a partir disso já poderíamos refletir bastante. Assim o homem teria uma maior tendência a características de impulsividade, de ataque, de desbravamento. E um poder talvez mais explícito. Enquanto a mulher teria uma maior tendência a características de acolhimento, de nutrição, de gestação. Um poder talvez mais sútil, e por vezes oculto.
Ao longo da História assistimos então o masculino subjugar o feminino quando pensamos em poder. O poder sempre se concentrou no masculino. Assim as sociedades elegeram seus líderes. O macho alfa do grupo. Este seria dotado de toda a responsabilidade, do controle e das decisões sobre a vida de cada membro do grupo. O poder era centralizado na sua figura. A isso se deu o nome de estrutura piramidal. Piramidal porque assistimos isso já com os egípcios, na figura do faraó. Uma única pessoa, na ponta de uma pirâmide, que detinha o poder – divino ainda! – sobre a vida de todos os que vinham abaixo. Assistimos esse modelo de gestão também na Grécia Antiga, que apesar de ser o berço da democracia, deixava as mulheres de fora das decisões da polis. Esse modelo prevaleceu nas empresas, na Igreja, dentro dos lares familiares... O chefe. O Deus. O pai. Mas hoje cada vez mais estamos assistimos a crise desse modelo piramidal que está vindo abaixo. Observo uma crise que na verdade sinaliza a uma nova forma. É como se a estrutura tradicional de poder – um poder até então masculino – estivesse se esfacelando literalmente.
Nas empresas é cada vez mais comum assistirmos as mulheres – ou melhor: o feminino – tomar à frente nas decisões estratégicas. A gestão das empresas está mais “feminina”. Hoje é muito mais comum entrar nas decisões estratégicas corporativas assuntos como saúde e qualidade de vida no trabalho; uma gestão colaborativa, humanizada e holística (fatores biopsicossociais que impactam a vida dos colaboradores). Isso tem muito a ver com gestar e nutrir – que é da ordem do feminino. E pouco importa se à frente dessas organizações terá um homem ou uma mulher, a questão está na capacidade do indivíduo de acolher e de nutrir o seu grupo para obter dele o melhor rendimento. Não é filantropia. Ainda é bussiness! Mas o olhar está bem diferente do que já foi um dia…
Nas
famílias hoje em dia observarmos muito mais notadamente a saída da
figura do grande pai. Aquele que dava a última palavra e todos na
mesa consentiam, pois ele tinha a voz de comando. Hoje as famílias são compostas de variados formatos e não cabe mais o poder
centralizado nas mãos de uma única pessoa. Os membros opinam,
reivindicam e há mais espaço às discussões e ao debate.
Mas como toda transição, obviamente essa também tem as suas dificuldades. E observo dois fenômenos principais acontecendo. O primeiro é um feminino ressentido. Vingativo. Quase tirânico. Depois de séculos de subjugação e massacre, assistimos hoje um feminino no famoso movimento pêndulo. O que antes foi amordaçado e descreditado, agora que se desacorrentou, liberou uma pulsão de vida tão forte que beira pulsão de morte. Movimentos de destruição. Mulheres fortes, empoderadas, donas de si, buscando escalar a antiga pirâmide, como os homens fizeram um dia, e lá se estabelecendo – sozinhas! E no menor sinal da aparição do fantasma da subjugação masculina vem à tona movimentos de extrema fúria – justificados e legítimos! Mas o movimento do pêndulo mostra que ao levarmos numa posição extrema, quando soltamos ele irá ao seu extremo oposto até encontrar o seu eixo. Jung dizia que “mais cedo ou mais tarde, tudo se transforma no seu oposto”.
O outro fenômeno que observo é um masculino que não está sabendo se encontrar. Homens cada vez mais perdidos num mundo cada dia mais feminino. É curioso que esse fenômeno tem gerado no masculino dois cursos, bem polarizados também. De um lado um masculino com uma feminilidade bem acentuada. É observável que entre as novas gerações há meninos bastante femininos, delicados, com uma feminilidade bem acentuada. Usam maquiagem, pintam as unhas, trajam vestidos. Costumes até então mais vistos dentro do universo feminino. E não faço aqui qualquer julgamento de valor sobre isso. Trago um fato observável. E isso também não tem absolutamente nada a ver com a orientação sexual propriamente dita. Apesar de que as novas gerações já demonstram uma relação com a sexualidade mais fluída, aberta, menos classificativa.
Por outro lado, existe também um masculino ressentido. Aquele que perdeu espaço, e que anseia descontroladamente retomar o poder! E está difícil para ele assumir que o mundo mudou. A roupagem mudou. A linguagem mudou. As relações são outras. E isso exige, pelo menos, novas formas de enxergar o mundo daqui por diante. Uma abertura ao novo e abrir mão do que ficou para trás. Como disse anteriormente, a estrutura piramidal está caindo e não adianta ficarmos choramingando sobre os escombros. Ao passo que uma nova estrutura está surgindo aí, que assim como a rede social, é em rede! Conectada. Cadeias de comando. Poder(es) horizontalizado(s). E isso muda radicalmente nossa maneira de pensar o mundo. O líder. O Grande Pai. E isso vale às religiões também. Observo cada vez mais uma Igreja Católica, por exemplo, se abrindo, revelando um Deus mais humanizado e aberto do que outrora, quando assistimos um Deus tirano e castrador.
Vejo desafios pela frente. Mas também muitas oportunidades de avanços sociais. Não estou aqui para julgar o que é certo ou errado. Penso que o que é certo ou errado é o que vale a cada um. Cada um tem a sua vida e a vive como bem entender! Quero apenas nos fazer pensar com essas reflexões trazidas. Segundo os orientais, tudo na natureza é dual. Possuímos dentro de nós energias yin e yang (feminino e masculino). E não há subjugação nem controle, são forças que se complementam! Penso que hoje o feminino precisa aprender a lidar com o poder que agora claramente está em suas mãos. E o masculino precisa encontrar o seu lugar em meio a esse universo cada vez mais feminino. E ambos encontrarem pontos de equilíbrio, e de intersecção. Mas enquanto isso não acontecer presenciaremos um feminino masculinizado cada vez mais empoderado, e sozinho. E um masculino feminizado cada vez mais aberto, e perdido. Até que esse movimento pendular possa encontrar o seu eixo.
E você, como enxerga o mundo de hoje? Que tal pensar sobre isso?
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