terça-feira, 31 de dezembro de 2019

ENFORCADO EM 2019


     Essa é a última postagem de 2019. A postagem de hoje começou a dias, talvez semanas atrás, quando comecei a pensar sobre ela. Fiz reflexões profundas sobre como esse ano foi para mim procurando sintetiza-lo em poucas palavras, até encontrar apenas uma. Sacrifício! Auto-sacrifício, na verdade. Essa palavra definiria o meu ano de 2019. Você deve estar pensando que “não foi um ano bom então”. Diria o contrário. Apesar de ter sido sim um ano DIFÍCIL, o balanço geral é positivo, porque foram movimentos CONSCIENTES.

     Na imagem dessa postagem vocês observam uma carta do tarot, O Enforcado ou Dependurado. Sou apaixonado pelo tarot pela sua SIMBOLOGIA. Adoro simbologia. Gosto de figuras de linguagem, analogias, a significação das coisas e o que somos capazes de aprender. Desde de criança gosto de mitologias. Gosto da psicologia analítica e dos arquétipos do Jung. O símbolo tem um significado. O corpo fala. Uma imagem fala mais do que mil palavras. Sou interessado no que está oculto, no que não foi dito, no que está submerso e nem sempre vem à consciência. 

     Gosto de observar a vida e os seus movimentos. Gosto de observar as pessoas, as conversas, os conflitos. Gosto de me observar. Prestar atenção aos detalhes. Sons. Gestos. Olhares. Silêncios... Aprender a procurar o conteúdo latente ofuscado por aquilo que alguém está expressando. Aprender que às vezes esses conteúdos podem divergir: algo mostrado na superfície diverge do que está submerso. Aprender também a discernir quando o conteúdo por mim visto é uma projeção minha. Freud trouxe o conhecimento de uma instância psíquica chamada de Inconsciente. Aprendi então que uma pessoa não é mentirosa ou falsa – como julgava muitos no passado – quando me mostra algo diferente do que estou captando, pois talvez ela não tenha ainda consciência disso. E não cabe a mim trazer isso à tona. Essa é a tônica dessa postagem: a vaidade por trás de tentar expor os conteúdos alheios e de julgar saber o que é melhor para os outros.

     De todas as teorias psicológicas que conheci, me incomodava a psicanálise. E tudo começou com a psicanálise. Me irritava com essa abordagem e entrava em impasses com psicanalistas, porque a achava “passiva”. Me incomodava o fato de uma pessoa de fora (o analista) enxergando muitas vezes claramente uma situação, não intervir. Não falar aberta e objetivamente o que ele está captando. Tinha a crença que seria muito melhor se fosse direto! Quando fiz uma especialização em psicologia organizacional, estudei numa disciplina mais sobre a abordagem psicanalítica e convivendo com psicanalistas e conversando com eles entendi melhor a psicanálise. Compreendo hoje que o que leva anos para se construir não se “descontrói” da noite para o dia. E expor o que vejo nos outros só revelará uma necessidade egóica minha. A de querer estar certo e ficar com a razão. E quem tem razão?!

     Onde quero chegar com tudo isso? Eu aprendi... Ou melhor... A vida me ensinou que eu não sei o que é melhor para uma pessoa que eu gosto. E isso dói sabe onde? No ego. Quantas vezes tentamos intervir numa situação, numa história, na vida de uma pessoa, seja de um familiar, de um amigo, de alguém que gostamos muito e tentamos falar para essa pessoa o que é melhor para ela? A gente quer o bem dessa pessoa? Sim. Estamos imbuídos de boas intenções? Sim. Mas até onde não estaríamos tentando CONTROLAR a situação? É duro admitir isso, porque dói no ego, mas é controle. Quando entramos, até sem a autorização clara, na vida das pessoas que a gente ama e tentamos mostrar a elas, quase impondo, o melhor caminho para elas é um sinal de prepotência velada. Ao fazer isso nos colocamos num pedestal onde nos julgamos melhores, pois saberíamos o melhor a ser feito e ditamos o que o outro precisa fazer para obter sucesso, saúde, bem-estar. E isso é tão falso, né gente... Muitas vezes a gente não sabe direito nem o que é melhor à nossa própria vida, como podemos julgar saber o que será melhor na vida de outra pessoa? Mesmo que isso seja uma atitude por amor, no fundo é só vaidade. Controle. E ego.   

     Eu tinha essa crença inconsciente. Quando eu gosto de uma pessoa, tento imaginar o que seria melhor para ela e vou a empurrando em direção a isso (inconscientemente). Vou condicionando seu caminho. Quem fazia isso comigo? Meu pai. Ele se achava muito certo e no direito de escolher todos os meus caminhos. Ele fazia isso por amor? Sim. Ele me amava demais. Só que no fundo eu nunca gostei disso, pois só me fazia sentir manipulado, controlado e o pior de tudo: que eu não era aceito nem amado por ele do jeito que eu era. Então perto dele me sentia sempre em falta, sempre aquém. Quando entramos na vida das pessoas que gostamos para verificar o que seria melhor para elas, subentende-se aqui que do jeito que elas são não é possível ou não serve para nós. Numa tentativa de fazer o bem para a pessoa, estamos fazendo mais mal. 

     É duro admitir que tenho esse comportamento crítico do meu pai. Tudo o que eu odiava nele, como sua crítica excessiva, seu ego inflamado, seu excesso de controle, o rigor desmedido, às vezes sem perceber reproduzo esses comportamentos, não só com os outros, como comigo mesmo. E por que é duro admitir isso? Porque sou igualzinho a ele. Entenda que a pessoa que você mais briga, que mais bate de frente e te irrita é justamente porque vocês se parecem! Aceita que dói menos. Hoje, entendendo melhor alguns conceitos da psicanálise, percebo que reproduzimos comportamentos no automático, mas não basta você ter o conhecimento de um mecanismo inconsciente, você precisa elabora-lo

     O que eu quero dizer é que um comportamento inconsciente não deixará de atuar só porque se teve conhecimento dele, pois ele tenderá sempre a se repetir. É como um disco riscado que a música trava ali, é uma tendência ficar se repetindo. É uma marca, uma cicatriz no nosso psiquismo. O que quero dizer com isso? Como fui criado por um pai com essas características e sempre fui mais apegado a ele, “registrei” esse comportamento mesmo não gostando! Por amor a ele! Sou sim excessivamente crítico, orgulhoso, gosto de controlar tudo e rigoroso, por mais que eu não goste disso. Ter consciência disso não vai MUDAR o meu jeito de ser, MAS pode me oferecer ferramentas para me trabalhar melhor. Assim, quanto mais consciência tiver desse funcionamento da minha personalidade, e das razões disso estar vindo à tona, obtenho mais autonomia para decidir se valerá a pena ou não persistir nisso. 

E você, já se observou para descobrir quais crenças tem e quais comportamentos reproduz sem muita consciência? Quem te ensinou a ser assim? Por que você continua com isso? Vale a pena continuar? 

     Agora, você deve estar se perguntando: o que isso tem a ver com a carta do tarot? 

     A carta significa um sacrifício consciente. Note que a personagem da carta, mesmo dependurada, está com uma expressão de tranquilidade, pois ela chamou essa situação. Significa uma crise “provocada”. É uma atitude consciente que despertou uma crise. É sacrificante, porque a situação nunca será confortável (embora esperada): a figura está suspensa pelos pés. Mas veja que interessante: isso lhe dá a oportunidade de ver numa perspectiva diferente! Essa mensagem figura o meu ano de 2019. Ao tomar consciência de algumas questões, tomei conscientemente também decisões que não foram fáceis, pelo contrário, foi doloroso. Porém me fez enxergar a vida por outros ângulos. E isso mudou tudo.



Desejo de coração a todos que tenham um 2020 repleto de Amor. Paz. Saúde. E consciência.


quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

VALORES MAIORES



     Todos nós temos uma parte em nós mesmos que é sagrada. É aquela nossa parte que é madura, responsável e sábia. Em alguns talvez essa parte seja mais desenvolvida, em outros talvez menos. Mas todos a temos. A questão é que não usamos. Não, com frequência. Costumo pensar que essa parte é como uma ponta de uma conexão direta com algo superior, que para mim é Deus. É como se Deus estivesse num ponto e no outro ponto cada um de nós, e esse fio é o que nos ligaria. Nos momentos mais decisivos de nossa vida nos conectamos com essa fonte e obtemos força, coragem, conforto e sabedoria principalmente. Hoje, mais do que nunca, é de extrema urgência e importância que você aprenda a acessar essa conexão que vou chamar aqui de Eu Superior e vou te explicar o porquê.

     Todos nós estamos passando por problemas. Seja branco, preto, amarelo, rico, pobre, casado, solteiro, todos temos problemas. Muitas vezes tendemos a acreditar que uma ou outra determinada pessoa não tem problema, porque, de fora, observando a vida dessa pessoa a julgamos perfeita. Como se existissem pessoas com vidas melhores do que a nossa. Gostaria que tirasse esse conceito de sua cabeça, porque isso não é verdade. Todas as pessoas estão enfrentando seus dilemas e demônios pessoais. Acreditar que exista uma vida perfeita ou um relacionamento desses de contos de fadas é ilusão. Na vida real todos sofrem, choram e matam um leão por dia, ainda mais nos dias de hoje. A questão é que a grande maioria das pessoas usam máscaras sociais bem montadas e pintam a cena muito bem. Mas só Deus sabe o que habita o interior de algumas casas; de alguns relacionamentos; o interior de algumas pessoas.

     No passado, as pessoas tinham mais tempo e dedicavam mais energia umas às outras. Era comum você ter um ou mais amigos íntimos que você pudesse contar. Contar para conversar, chorar, desabafar, e ali, olho no olho, ombro a ombro, coisas eram ditas e isso era uma elaboração. Friso aqui exatamente esse aspecto: a elaboração através de uma fala amiga. Muitos não se dão conta, mas quando você está com alguma questão pessoal, só o fato de você desabafar isso com um amigo já é positivo. Por mais que esse amigo não seja um psicólogo, um psiquiatra ou um psicanalista, o falar sobre a questão para alguém que te olhe nos olhos e esteja com ouvidos atentos em você, está acontecendo aí um movimento terapêutico. Quando falamos com alguém que está conscientemente prestando atenção em nós, com doação sincera de tempo, ganhamos a oportunidade de nos ouvir enquanto falamos. Ouvimos nossa questão e somos capazes, em algum nível, de nos ver de fora e isso é muito significativo para a saúde mental. Ou seja, amizades sinceras valem muito!

     A realidade de hoje é diferente. Quantas pessoas, de profunda confiança sua, você poderia ligar agora e chamar para sair e conversar um pouco? Pessoas que você saberia que sentariam com você com total entrega de tempo, de energia e com atenção ouviriam o que você tem a dizer, sem julgar, sem criticar e até ajudariam a encontrar um caminho se necessário – quantas? Quase não temos mais. Mas isso não é culpa de ninguém, porque a maioria das pessoas não tem tempo, energia, nem atenção suficientes para a própria vida. As pessoas estão cansadas, muitas estão na defensiva e estão vivendo como podem, com o que tem, da forma como estão conseguindo. Ou seja, nós estamos sobrevivendo da forma como podemos. Deveríamos buscar ajuda de um profissional da saúde? Deveríamos! Estamos procurando? Muito pouco! Talvez por isso observamos tantas pessoas exauridas fisicamente, doentes mentalmente, porque não têm com quem contar e não buscam ajuda.

     Aqui entra o Eu Superior que habita em cada um de nós. Todos nós temos dentro de nós essa voz de sabedoria que nos guia. Defendo aqui a busca pela espiritualidade. Não adianta você se queixar que uma determinada pessoa não te ajuda ou não te compreende, porque talvez essa pessoa não compreenda a si mesma. Já parou para pensar, o que pode estar enfrentando as pessoas que você busca auxílio, compreensão ou afeto? Seja quem for que você esteja esperando que te compreenda ou te auxilie, se essa pessoa não dá a devolutiva ou a atenção que você espera é porque ela não pode. Ou talvez não queira. Ou não tenha tempo. Em todo caso, não vai resolver brigar ou se ressentir com essa pessoa. Cada um dá o que tem. Se essa pessoa não te compreende, não te ouve, não te valoriza o suficiente, procure você se compreender, se ouvir e se valorizar, porque isso está em seu controle. Exigir que o outro seja de determinada maneira ou dê algo que ele não quer ou não pode dar é tolice. É batalha perdida antes mesmo de iniciada. Procure entrar mais em contato com você mesmo. Conheça seus pontos fortes e seus pontos vulneráveis. Aprenda a se amar primeiro e ser o seu melhor amigo. Analise-se sempre que possível. Quanto mais você for capaz de se conectar consigo mesmo, mais em paz você estará. Assim, ficará menos sensível às turbulências externas e menos ressentido quando alguém não te der a atenção merecida.

     Depois de muito me magoar com as pessoas que não correspondiam as minhas expectativas ou não davam a atenção que eu julgava que merecia ter, resolvi mudar o meu jeito de ser. Passei a não ter grandes expectativas em relação ao comportamento das pessoas. Aceito e tento compreender o que alguém pode ou quer me oferecer. E seja quem for. Mãe, chefe, amigos, colegas de trabalho. Percebi que a gente sempre desenvolve, até sem querer, uma crença de que as pessoas têm que se comportar como esperamos que elas se comportem. “Porque MINHA mãe não pode fazer isso COMIGO”. “Porque o MEU melhor amigo não podia fazer aquilo COMIGO”. “Porque MEU/MINHA chefe não ME compreende”. “Porque o mundo é muito duro para MIM”. Quando fazemos esses discursos ou temos esses pensamentos, dando demasiada ênfase em nós mesmos, só falta enfiarmos uma chupeta na boca e batermos as pernas no chão chorando por atenção. Estamos regredindo a um comportamento infantil. Quando me pego nessas queixas bancando uma vítima sofredora, procuro rapidamente sair desse lance. E repetir mentalmente a mim mesmo coisas como: “tal pessoa é como é”; “deu o que quis ou podia dar”; “não tenho controle sobre as pessoas, tenho sobre mim e o que posso fazer com isso”; “reclamar, me ressentir, ir lá brigar ou exigir que me ajudem ou me compreendam não resolve nada”; “cada um dá o que tem”. Com essa mentalidade inverto uma ânsia de aprovação ou carência de afeto por sabedoria.

     Aqui o Eu Superior está entrando em cena. A parte adulta que vai lidar com a situação. Abre o espaço para me conectar com valores maiores como Compaixão, Sabedoria, Fraternidade e Amor. De posse desses valores maiores posso ver as situações com amor ao invés de raiva. Ver as pessoas com compaixão ao invés de ressentimento. Compreender que minha mágoa tem muito mais a ver com uma expectativa egoica minha do que com o outro de fato e que se alguém não me ajudou como esperava, talvez fosse porque essa pessoa precisasse de ajuda também. E aí acontece algo muito bacana: o quadro todo se inverte. Ao me alinhar com Deus, com essa parte superior e sagrada que habita em nós, tudo fica tão pequeno, começando por mim e isso me supre completamente. Sinto que posso então oferecer auxílio até para quem por algum motivo não pôde ou não quis me ajudar. E isso se chama ALTRUÍSMO, o comportamento mais humano e mais puro que uma pessoa é capaz de alcançar em vida. Esse é o nosso verdadeiro objetivo aqui. Namastê.🙏