“Prefiro o sonho à ilusão; no sonho sabe-se que temos os olhos fechados; na ilusão julgamos tê-los abertos.” (Marie de Beausacq)
O
universo é infinitamente grande para fora assim como é
infinitamente grande para dentro. Uma transformação aplicada no
lado externo pode ser também aplicada no lado interno. Existem
benefícios na concentração de energia para ambos os caminhos. Não
entendo porque passamos toda a vida praticamente voltados apenas ao
lado de fora.
Somos
criados para nos tornar exímios transformadores do externo, em
detrimento de conquistas internas. Um dia saímos de uma barriga. Um
dia saímos das cavernas. Saímos do chão, deste planeta, a quem
diga que saímos de nosso corpo, da realidade, da vida uns dos
outros, que nos acostumamos com uma única direção. “Para fora”.
Poucos visam a direção contrária. O mergulhar em si mesmo. O se
autoconhecer. O lapidar-se.
Quanto
mais se avançou a sociedade mais fomos estimulados a olhar para o
que estava fora de nós e transformar o entorno. E nos tornamos bons
nisso. Construímos pirâmides. Arranha céus. Aviões. Foguetes.
Naves espaciais. Tecnologias das mais variadas. Aprendemos na escola
a ler e a escrever antes de conhecer qual o impacto de cada palavra.
Aprendemos a conversar antes de ouvir o som daquilo que queremos
dizer. Pensamos no que estamos sentindo mas raramente sentimos aquilo
que pensamos. Abrimos nossas vidas para outras pessoas adentrarem,
nos amarem; para estranhos nos conhecerem. Enquanto o universo
expande porta à fora no interior tudo permanece praticamente
intacto por nós. Inabitado. Somos desproporcionalmente realizadores
internamente.
Na
sociedade atual todos estão sempre se movendo, conversando,
gesticulando, fazendo barulho, mas nunca nos encontramos em silêncio.
Mas isso parece proposital já que o silêncio incita ao que não
estamos acostumados: olhar para dentro. E também parece que não
queremos isso. Não queremos ouvir os nossos pensamentos. Mergulhar em
nossas emoções. Entender os nossos medos. Tocar em certas feridas.
Refletir atos ou decisões. Não olhamos para o nosso interior porque
talvez temamos a nós mesmos mais do que qualquer coisa neste mundo.
E no fundo este receio venha de um único medo: a finitude. O
medo da morte. Corremos tanto, construímos tanto, acumulamos tanto,
porque tudo o que mais queremos é encontrar um ponto fixo, uma saída
para trapacear a morte. Alcançar um estágio permanente, imutável, que
nos permita esquecer a efemeridade que é a vida.
Não
fazer mais parte apenas dos transformadores externos é uma escolha bem
pessoal. Por vezes é necessário abrir mão de algumas ilusões.
Outras vezes dói bastante. Mas acredito que quando decidimos parar alguns instantes, nos
silenciar, refletir, olhar para dentro e executar revoluções
internas, passamos a nos conhecer mais. A viver melhor a vida. A
aceitar a morte. Descobrimos um novo espaço. Infinitamente grande. Apenas esperando para ser explorado...
“Para
quê olhar para os crepúsculos se tenho em mim milhares de
crepúsculos diversos - alguns dos quais que o não são - e se, além
de os olhar dentro de mim, eu próprio os sou, por dentro?”
(Fernando Pessoa)
(Fernando Pessoa)