Toda organização (seja ela pública, privada, uma ONG etc.) podemos
dizer que é composta por um conjunto de elementos físicos e não-físicos. Como
exemplos de elementos físicos podemos citar resumidamente a matéria prima, o maquinário,
as instalações, o layout produtivo, as pessoas envolvidas etc. Como exemplos de
elementos não-físicos podemos citar, também de forma breve, a tecnologia de
informação, a contabilização, o conhecimento, o planejamento, a comunicação, a
cultura, a construção de uma hierarquia e como se dá o processo decisório (mais
verticalização; mais horizontalização) etc. Toda organização impacta e também
será impactada pelos elementos (físicos e não-físicos) externos, como por
exemplo a sociedade na qual está inserida; o meio ambiente; o seu público alvo;
o governo (impostos, legislações, informações obrigatórias etc.). A chave do
bom funcionamento da dinâmica desses elementos está na sua gestão. É a administração da organização.
De forma resumida (mas nem tanto) expus acima o principal escopo
de ensino de um curso de Administração de Empresas – do qual tenho formação.
Nesse curso você vê um menu de teorias e técnicas e perpassa por todas as áreas
e setores que existem numa organização, através das disciplinas. É um curso
amplo, genérico, que entrega o que se promete: uma visão sistêmica do todo.
Quando falamos em administrar uma organização, de todos os
elementos que eu citei, na minha opinião, hoje mais do que nunca o calcanhar de
Aquiles é o fator Humano. A tecnologia da informação é importante. A
comunicação é importante. A gestão do conhecimento, o planejamento e o
cumprimento da legislação são importantes. Todos os elementos têm a sua devida
importância. No entanto, por trás de todos esses elementos existem o quê? Pessoas.
Ao isolarmos cada organização, cada área, cada setor, cada elemento, cada
processo, para se chegar numa matriz originária, vamos descobrir que ali reside
um ser humano. Portanto, é verdade que essencialmente são as pessoas que levam
a organização em direção aos objetivos esperados. E dessa forma, faz com que a
Gestão de Pessoas seja hoje o braço direito da administração de qualquer
empresa. E é verdade também que será a gestão mais difícil de todas, porque
envolve o elemento mais complexo de todos, pois cada ser humano é único,
dotado de subjetividade e influenciado por fatores biopsicossociais.
A questão é: o curso de Administração de Empresas capacita para
gerir pessoas? Não. (E agora os
administradores vão cair de pau em cima de mim rs rs). Não capacita. Em Administração
de Empresas você estuda teorias, aprende técnicas, há uma bagagem de cálculo,
mas não se vê profundamente e não se tem muitas disciplinas voltadas à Gestão
de Pessoas. E não sei também se esse é o foco do curso, pois como já dito
acima, o curso entrega um conhecimento amplo e mais generalista da
Administração, e depois de formado o profissional vai se especializar na área
que ele quer ou se identificou mais. Como acontece em muitos outros cursos de
graduação! Não tem nada de errado com isso. E eu adorei o curso que fiz, se
voltasse atrás teria escolhido novamente sem sombra de dúvida, mas eu já até falei
sobre isso aqui; no meu segundo ano de faculdade tive a oportunidade de liderar
uma equipe e eu pedi para sair. Eu não consegui! Isso significa que todo
administrador não conseguirá? Óbvio que não. Não é correto generalizar. Mas – na
minha opinião – o administrador tem uma “tendência”
a ser mais objetivo, mais
burocrático, mais técnico, talvez até mais rigoroso e a perceber e compreender menos
as questões subjetivas dentro
da organização e os fatores
biopsicossociais que podem estar impactando os trabalhadores. Não é uma
característica ruim essa, é apenas uma visão. Se eu fosse sintetizar numa
frase, eu diria que: “o administrador tem
uma tendência a enxergar a relação Empregador x Empregado como unicamente uma relação comercial”.
Aí vou trazer outra questão: então seria aquele com formação em
Psicologia o profissional mais indicado ao Recursos Humanos, à Gestão de
Pessoas? Não. (E agora os psicólogos vão
cair de pau em cima de mim rs rs). Eu não tenho graduação em Psicologia, sou
graduado em Administração, mas na minha opinião, pelo que observo, o curso de
Psicologia também não capacita o psicólogo (como precisaria) para dar cabo da
organização. Me desculpem. Eu me pós-graduei em Recursos Humanos, depois fiz
Gestão de Pessoas, e fiz Psicologia Organizacional e do Trabalho, e atuo nessa
área há anos. Se existe déficit na formação do administrador para dar cabo
desse desafio, ao psicólogo também. A visão aí vai radicalmente para a outra
ponta. Eu sou apaixonado pela Psicologia, como adoro os meus amigos psicólogos,
tenho planos até de cursar a graduação, mas pelo que observo (com o perdão do
engano) é uma ciência que, se o estudante não é bem orientado quando ele opta
pela Organizacional, quando ele cai na organização de fato, ele tem dificuldade
pois tem uma “tendência” a
ser humano demais. Se o
administrador tende a enxergar a relação trabalhista como puramente comercial,
o psicólogo é o inverso, ele tende a esquecer que é business. Que é um negócio, dentro de um sistema
capitalista, amarrado por um contrato
de trabalho. Ou seja, as partes em comum acordo se acertaram que o empregador
pagará “x” para o empregado entregar “y”. Ou seja, se em algum momento o
empregado entregar menos, seja em horas trabalhadas ou em quantidade produtiva,
está errado. Há um descumprimento aí, que tem que ser averiguado.
E o psicólogo certamente argumentaria que por trás do
trabalhador existem “n” fatores que podem estar o impossibilitando de cumprir
com o combinado (os fatores
biopsicossociais). Ok, é compreensível, vamos então averiguar o que se
passa e veremos o que é possível ser
feito. Mas a questão é: quanto tempo temos disponível para isso? Lembrando
que estamos amarrados por um contrato, numa relação de negócio e estamos
equacionando “tempo x custo x
benefício”. E o psicólogo tenderia a achar isso muito frio, muito
calculista, muito pragmático. Mas devemos lembrar que, caso a organização não
seja uma instituição filantrópica, seu objetivo primordial é o lucro. O
empresário começa uma atividade econômica porque ele quer obter lucro. E não
tem nada de errado com isso, estamos num sistema capitalista – se é bom ou mau,
é este o que temos. Essa visão demasiadamente humana de alguns psicólogos,
quando vão para a organização, tem mais a ver com a Psicologia Social do que
propriamente com a Psicologia Organizacional e do Trabalho. Se o Estado não tem
uma estrutura que possa dar suporte ao trabalhador, vamos jogar essa bola ao
empresário?
Numa aula uma professora (psicóloga) nos pediu a seguinte
reflexão: “você tem uma babá que cuida de
seus filhos enquanto você precisa trabalhar. Um dia a babá te liga que não
poderá ir trabalhar porque seu filho está doente. Na semana seguinte ela liga e
diz que não poderá ir trabalhar porque terá consulta médica. Depois ela liga
que não poderá ir trabalhar por um outro motivo qualquer (mas justificável).
Todas as vezes que a babá falta ela justifica, mas ou você precisa faltar do
seu trabalho ou precisa se virar com as crianças. Quanto tempo você mantém essa
situação, sem trocar de babá?”. Note que em nenhum momento está se julgando
a conduta da babá no exemplo, pois ela está faltando ao trabalho por motivos
justificáveis. Muito compreensíveis. Mas será que é o empregador quem dever
arcar com esse custo? E por quanto tempo ele consegue fazer isso?
Na minha visão, o profissional que atua em Gestão de Pessoas tem
que entender que a relação é comercial então precisa sim existir um certo
pragmatismo; a atividade econômica visa o lucro e não convém perde-lo de vista
(para o bem de todos: empregador, empregado e governo!). A contrapartida
o capital mais importante de uma organização não é tecnologia nem são as
máquinas, já se sabe que são as pessoas, que hoje mais do que nunca é chamado
de Capital Intelectual. E ele
necessita sim ser valorizado. Mas valorizar não significa sair concedendo
aumento de salário ou dar mais benefícios indiscriminadamente, ou fazer vista
grossa para tudo, porque se isso não é pensado econômica e financeiramente falando,
é uma atitude irresponsável porque a longo prazo coloca a própria atividade
econômica em risco. O ponto foco da Gestão de Pessoas é ser capaz de enxergar o
trabalhador com seus pontos fortes e pontos a serem trabalhados, levar em
consideração que a motivação é intrínseca, portanto é pessoal. Alguns
funcionários irão trabalhar exclusivamente pelo salário para pagar contas,
outros já gostam do que fazem, outros gostam do ambiente e dos colegas, outros
gostam da oportunidade de desafio que foi dada, outros gostam de aprender e
querem crescer profissionalmente etc. Cada funcionário tem as suas próprias
demandas, as suas próprias necessidades, ele gosta e quer que a empresa perceba
isso. E a empresa deve fazê-lo, dentro do que é possível ser feito em dado
momento.
A questão que fica então é: qual seria a melhor formação para se
atuar em Gestão de Pessoas? Não tem. (E
agora quem está estudando pra isso vai cair de pau em cima de mim rs rs).
Sinceramente falando, eu não sei se existe uma graduação específica. Assim como
não sei se é necessário ter uma graduação para isso. Conheço empresários que não
tem formação superior e dariam uma verdadeira aula nesse quesito. Assim como
conheço ótimos gestores que são graduados em Comunicação, em Engenharias, em
Direito, em Economia etc. Talvez o foco nem seja o curso, mas sim o indivíduo.
Prefiro pensar que um gestor precisa ser técnico o suficiente para não perder
de vista o negócio em que atua, mas precisa também ser humano o suficiente para
não perder de vista aquilo que ele tem nas mãos, o seu capital intelectual! E quando
bate uma dúvida gosto ainda de recorrer aquela célebre frase do Jung: “conheça todas as teorias, domine todas as
técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.